Assédio sexual acontecendo até dentro da Rede Globo
Foto: DivulgaçãoWednesday, 05 April 2017
O caso envolvendo o ator José Mayer serve como um grande alerta para quem sofre com esse tipo de abuso: se ninguém souber que estão te assediando, ninguém vai poder te ajudar.
Na última sexta (31/03) uma figurinista da Rede Globo de televisão chamada Susllem Tonani acusou o renomado ator José Mayer de assédio sexual na coluna ‘Agora é que são Elas’ do site da Folha de S.Paulo.
A profissional de 28 anos conta que a investida do ator começou com pequenos elogios, avançando para comentários vulgares sobre seus atributos físicos e culminando no ato onde ele teria, na frente de outras pessoas, passado deliberadamente a mão na genitália da jovem afirmando que o órgão dela era “um desejo antigo”.
Depois disso, diante da negativa dela, ainda a teria chamado de “vaca” na frente de várias pessoas.
Na verdade a notícia não é exatamente da Folha de S.Paulo e tampouco aconteceu há uma semana: esse fato foi noticiado pelo jornal carioca O Dia em texto do blogueiro e jornalista Léo Dias em 3 de março. O que a Folha fez foi pegar o conteúdo da notícia e ‘requentá-lo’, citando o nome da vítima e publicando sua fotografia. Isso, claro, mais de um mês depois do ocorrido.
No texto onde Susllem acusa Mayer, são usados termos pesados, como o momento em que ela diz: “Sim, ele colocou a mão na minha b*c*t* e ainda disse que esse era seu desejo antigo" (censuramos o palavrão em respeito aos nossos leitores mais sensíveis).
Em um primeiro momento Mayer negou a acusação. Disse que estava sendo confundido com o personagem que fazia na novela das 21h. Alguns artistas o defenderam no momento. O comediante Marcelo Madureira (ex-Casseta & Planeta) chegou a afirmar que, embora não o defendesse, entendia que às vezes a imersão de um ator em um personagem se torna profunda demais. Nesse caso é um alívio que o personagem de Mayer não fosse um assassino em série...
Imediatamente as testemunhas se manifestaram e várias funcionárias da Globo – incluindo atrizes do calibre da talentosíssima Alinne Moraes – postaram em suas redes sociais ou até se vestiram com camisetas que traziam a frase “Mexeu com uma, mexeu com todas”.
Diante do número de testemunhas sobre o ocorrido, Mayer acabou admitindo ter cometido erros sem especificar exatamente quais foram e dizendo que era fruto de uma geração machista que entendia brincadeiras sexuais com mulheres como algo normal quando, na verdade, é algo errado. Mesmo assim a emissora o suspendeu de suas produções por tempo indeterminado.
Mas por que esse caso teve visibilidade? Porque envolveu uma personalidade conhecida e antológica na televisão brasileira e ocorreu dentro das dependências da maior emissora de televisão do mundo em frente de outras personalidades artísticas tão relevantes quanto. Apenas isso. E por ‘apenas’ não estamos minimizando o caso, mas o normatizando.
Quantas Susllem Tonani têm que suportar diariamente abusos sexuais verbais ou físicos de seus chefes e colegas de trabalho? Muitas. E por que elas não recebem atenção? Porque são anônimas. Porque seus agressores são anônimos. Porque o ambiente é anônimo. Mas a situação é séria.
Há casos aqui em Blumenau, por exemplo, de mulheres que usam casaco em pleno verão para evitar os comentários lascivos dos chefes que insistem em atitudes abusivas como perguntar (sem que lhes fosse dada a liberdade para isso) qual é a cor da lingerie que usam. Em outras situações mulheres têm que trocar de emprego por conta do assédio de colegas.
Isso é errado de várias formas, mas a principal é o desrespeito.
Assobiar para uma mulher que passa na rua ou gritar algum elogio vulgar sobre seus dotes físicos dificilmente vai fazer com que ela queira conhecer a pessoa que teve essa ação (a não ser se seja para lhe aplicar um merecido murro no meio do rosto).
Se você trabalha com uma bela mulher, mostre que seu respeito também pode ser belo. Se aquela moça que pega o ônibus com você todos os dias está te olhando e vocês se tornaram amigos, parabéns: é o primeiro passo para, quem sabe, vocês se conhecerem melhor. Mas se ela não está nem aí... bem... ela não está nem aí. É um direito dela. Respeite. Mas se você é chefe, sinceramente, não se envolva com funcionários. Mesmo que eles (ou elas) queiram. Quase sempre esse tipo de relação acaba mal para um dos lados (quando não para os dois).
Tente pensar que as mulheres que você conhece devem ter pai, filhos ou irmãos e pense se você gostaria que alguém agisse de forma tão asquerosa com sua mãe, filha ou irmã. É simples assim. O abuso está errado por milhares de motivos, mas o bom senso ajuda a combatê-lo.
Mas se é muito difícil para você imaginar que aquela linda garota no metrô poderia ser alguma parente amada enquanto você de forma repugnante se esfrega nela, pensa da seguinte forma: você gostaria que um homossexual ativo, musculoso, violento e com cara de mal começasse a se esfregar em você mesmo sendo você heterossexual? Provavelmente não. Então... as mulheres também.
Admito que uma vez, quando ainda era jovem, presenciei uma cena dessas num ônibus. O canalha parecia vitorioso e a moça acossada, sem ter para onde correr em um corredor de transporte coletivo lotado. Então, mesmo sendo heterossexual, me levantei e me posicionei atrás do agressor. Ele me olhou e, intimidado, passou a apresentar o mesmo comportamento da moça a quem estava abusando. Afinal, é mais fácil ser pedra do que vidraça.
Você pode achar pessoas bonitas. Deve, na verdade. Mas saiba como lidar com isso. Um não é um não e não entender isso pode causar sérios problemas aos dentes.
Entenda que as mulheres são pessoas como você e que tem os mesmos direitos que você. Caso você tenha fama de garanhão – o que estão afirmando ser o caso do ator supracitado = saiba que um não é um não. Insistir não vai transformar o ‘não’ em um ‘sim’, mas vai transformar você em um chato (ou em um criminoso).
Parece absurdo ter que dizer isso para pessoas adultas em pleno século XXI, mas: não fique bolinando as pessoas a não ser que elas permitam que você faça. E isso vale para homens e para mulheres também. Não é porque está lá e é bonito, que está livre para ser mexido.
O dia que as pessoas tiverem respeito e bom senso, o mundo vai ser um lugar melhor.
Quanto ao José Mayer... é realmente uma pena que um ator com tamanho talento e bagagem não tenha entendido coisas tão básicas. Mas que, pelo menos, esse caso sirva como alerta: moça... se estão te bolinando contra a sua vontade, não sinta vergonha de expor a situação... a culpa não é sua... entenda isso e denuncie qualquer canalha que abuse de você”.