Os formandos, a foto e o sexismo

Os formandos, a foto e o sexismo
Foto: Divulgação

Wednesday, 19 April 2017

A Furb anuncia que irá punir os acadêmicos de Medicina envolvidos na foto acima, mas este está longe de ser o mais relevante retrato do sexismo e da vulgaridade.

As pessoas têm um talento inacreditável de copiar o que não presta.

No Espírito Santo (ES) – na Universidade de Vila Velha (UVV) – sete acadêmicos do curso de Medicina tiraram uma fotografia simulando com as mãos genitálias femininas e postaram no Instagram com a hashtag #pintosnervosos.

A imagem causou um desconforto enorme e gerou profundas críticas em diversas redes sociais pelas quais se espalhou. A Universidade afirmou já saber quem são os envolvidos e garantiu que punições serão aplicadas. Alguns dos estudantes afirmaram que esse tipo de foto – realmente de péssimo gosto – é uma prática comum entre estudantes de Medicina e que a hashtag se referia ao nome de um grupo de WhatsApp do qual fazem parte.

Como se não bastasse, cinco formandos do curso de Medicina da Furb – exatamente isso... aqui de Blumenau – resolveram fazer o mesmo tipo de fotografia em frente ao Teatro Carlos Gomes. Mais uma vez choveram críticas e manifestações de repúdio.

Desta vez os envolvidos não se pronunciaram.

Ambas as universidades deixaram bastante claro que não apóiam esse tipo de comportamento e que execram profundamente o episódio. Entre as acusações está a de ‘exposição indevida de uma profissão’, afinal futuros médicos sérios podem se sentir tão ultrajados quanto as mulheres.

No final de semana correu por várias redes sociais que os envolvidos nos episódios nas duas situações sofreriam sanções por parte do Conselho Regional de Medicina (CRM) de seus respectivos estados, mas isso não é verdade por um fato muito simples: eles são alunos, não médicos. Ainda não possuem registros no CRM ou no Conselho Federal de Medicina (CFM).

As  punições deveram partir das faculdades onde estudam. Não podemos afirmar que algo acontecerá com os discentes do Espírito Santo, mas certamente os daqui – considerando a postura firme e íntegra da reitoria da Furb – certamente terão problemas.

Entretanto, a postura desses estudantes do legado de Hipócrates não é um episódio isolado e tampouco exclusivo. Os discursos sexista (tanto por parte de homens, a maioria, quanto de mulheres) são uma realidade bastante indigesta. O funk carioca (batidão, porque funk de verdade é outra coisa) é o mais recente exemplo desse costume grotesco.

Há quem defenda que suas letras vulgares e poses erotizadas são uma forma de protesto, enquanto outros afirmam que não passa de um espelho do machismo de uma sociedade que, via de regra, age de forma hipócrita dando medidas diferentes para pesos iguais.

Cinco alunos de Medicina imitando vulvas com as mãos ainda é menos ofensivo do que uma criança de 13 anos dizendo “roça o peru nela” (MC Brinquedo), “a novinha fica de quatro que eu vou te tacar o peru” (MC Pikachu), “minha piroca vai te refrescar” (MC Pedrinho), “fica com o popô no pau” (MC Boladinho) ou “será que alguém senta melhor que eu” (MC Pikena).

Além da vulgaridade, os quatro exemplos acima têm em comum a pouquíssima idade.

Então... sim... formando de Medicina fazendo gestos obscenos é incômodo, mas muito menos nocivos do que crianças sexualizadas berrando impropérios e chamando de música. Porque o destino dos futuros médicos já está sendo apurado e decidido pela Furb, mas as crianças do funk não. Ao contrário. Ao invés de repúdio, elas são incentivadas e, assim, incentivam outras crianças.

Mas são apenas crianças, certo? Certíssimo. Então que sejam punidos os pais, porque permitem que seus filhos de pouca idade ajam como chamariz de pedófilos e façam, mesmo sem perceber, com que a sexualidade infantil pareça cada vez mais banal.

Enquanto falsos moralistas continuarem procurando naqueles que estão onde almejam motivos de repúdio enquanto praticamente normatizam atos bem piores que lhes são cotidianos, o sexismo vai continuar existindo. E, aparentemente, cada vez se manifestando mais cedo. Mas a culpa deve ser dos estudantes apenas, claro...


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Ricardo Latorre

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