Suicídio: de jogos online a seriados, onde está a raiz do problema?

Suicídio: de jogos online a seriados, onde está a raiz do problema?
Foto: Divulgação

Thursday, 20 April 2017

A situação ficou tão séria que até a prefeitura convocou uma conversa na tarde de hoje para tentar ajudar depressivos e suicidas em potencial. Mas o que devemos saber sobre isso?

Não é um assunto agradável e nem todo mundo gosta de conversar a respeito, mas precisamos falar sobre isso: suicídio.

Um ‘jogo’ que aparentemente surgiu na internet chamado ‘Baleia Azul’ que supostamente teria sido criado na Rússia (país com altos índices de suicídio) estaria levando vários jovens a tirar suas próprias vidas. A gravidade é tamanha que autoridades estão se posicionando.

Em Blumenau, por exemplo, vai ocorrer às 14h45’ de hoje (20/04) no salão nobre da prefeitura um Diálogo sobre a problemática ‘Baleia Azul’. O problema realmente é sério.

Piorando ainda mais a situação, um dos seriados de maior sucesso nessa temporada é ‘Os 13 Porquês’ (no original ‘13 Reasons Why’), adaptação da Netflix de uma obra literária homônima de autoria de Jay Asher que conta a triste história de Hannah Baker (Katherine Langford), que se suicida após passar por vários traumas e deixa sete fitas de vídeo contando suas razões.

Apesar de a premissa desta excelente história ter como objetivo fazer com que jovens que pratiquem bullying se sensibilizem com os danos que podem causar aos outros, o que está havendo é o oposto: jovens estão se identificando com Hannah e tomando coragem para tirar a própria vida.

Claro que a alarmante taxa de suicídios não é culpa do seriado e nem inteiramente do ‘jogo’ supracitado, mas esses dois elementos trouxeram à luz um assunto que muitos evitam abordar, mas que, se abordado, pode mudar ou até salvar vidas.

Porém, convenhamos: uma pessoa que está bem não se deixaria seduzir por um ‘jogo’ que tem como intuito trazer sofrimento e perturbação ou mesmo se influenciaria por um seriado. Não. As pessoas que passam por isso sofrem de depressão, uma doença absurdamente séria e, infelizmente, muito pouco levada à devida importância pela grande maioria das pessoas.

Você, mãe ou pai, é fundamental que entenda: o ‘jogo’ não está matando ninguém pela mesma razão que armas não matam ninguém... são as pessoas que fazem isso. Antes de se preocupar com jogos e seriados, preocupe-se com o bem-estar psicológico de quem você ama. Atitudes auto-destrutivas não são a razão de mortes trágicas, mas sim consequências de pessoas que sofrem – muitas vezes silenciosamente – de condições como a depressão.

O discurso midiático do momento é ‘o jogo/série é perigoso porque vai fazer pessoas se matarem’. E isso não é verdade. No passado houve histeria em relação a suicídios atribuídos a livros como ‘Romeu e Julieta’ de Shakespeare ou até a músicas como ‘Gloomy Sunday’ de Rezső Seress.

Porém, convenhamos, uma pessoa perfeitamente sã não tiraria a própria vida por conta de um jogo, filme, série, livro ou música. Quem o faz, age porque precisava urgentemente de ajuda profissional e, infelizmente, só recebeu atenção (quando recebeu) tarde demais.

E sim... o tarde demais existe. E é tão inclemente quanto o tempo perdido pode ser.

Ao invés de focar no imediatismo, é fundamental se ater às raízes; aos distúrbios psicológicos que acometem tantas e tantas pessoas mundo a fora e, às vezes, ao seu lado.

Então entenda: A DEPRESSÂO NÃO É UMA FASE, NÃO É FRESCURA E NEM FALTA DO QUE FAZER. Não é doença de rico e muito menos algo que possa ser ignorado. Conselhos como “pense em coisas positivas”, “saia mais de casa”, “reze um pouquinho” ou “seja feliz por mim” (esse, definitivamente, o mais imbecil) são descartáveis, inúteis e muitas vezes prejudiciais.

O depressivo sofre de falhas em neurotransmissores e não sintetiza substâncias que o permitam estar ‘bem’. É totalmente INVOLUNTÁRIO. Ninguém é depressivo porque quer e mesmo aqueles que acham ‘bonito’ ter depressão não estão 100% bem.

Tentar forçar uma pessoa a ficar feliz porque vê-la desanimada lhe incomoda é desumano, mesquinho e ególatra. Ninguém é obrigado a estar bem e fazer uma pessoa que sofre com depressão se sentir mal por estar mal só vai piorar ainda mais a situação dela. Na hipótese menos negativa, ela vai se isolar de você. Na pior das hipóteses, vai sentir-se mal por estar mal.

O Brasil é o oitavo país com o maior índice de suicidas do planeta. E essas pessoas não se mataram pra ‘te castigar’ ou ‘por ingratidão’... elas se mataram porque em sua doença (e, sim, depressão É uma doença) tornou-se insuportável para elas viver.

Ter um filho, irmão, pai, namorado ou amigo depressivo não significa que você esteja falhando em fazer essa pessoa feliz: significa que ela precisa de remédios para balancearem os neurotransmissores que ela não consegue produzir e a maior prova de amor – e mais necessária prova de atenção – é prestar atenção e não subestimar essa doença.

Às vezes a falta de apoio da família torna o quadro – que já não tem acompanhamento profissional – ainda pior. Se você é do tipo que se ofende com a depressão de quem ama, saivá que você é um canalha que só pensa em si. Nos últimos 25 anos a taxa de suicídio entre os jovens aumentou 30% no país. No planeta, uma pessoa se mata a cada 40 segundos e, pode ter certeza, não é para atingir alguém. O suicídio é um ato desesperado. Uma solução permanente para um problema que pode ser transitório se devidamente tratado.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) até 2020 a depressão vai ser a doença mais incapacitante do mundo. Hoje já são quase 10% dos brasileiros diagnosticados com a doença. E esses são números oficiais, ou seja, contam apenas as pessoas que procuraram ajuda.

Vídeos de pessoas tentando pular de pontes geralmente criam uma mistura de curiosidade mórbida com desespero por não poder ajudar uma pessoa que está absolutamente desesperada. Já aconteceu em Blumenau e sempre que o assunto retorna à tona recebemos diversas mensagens de pessoas que sofrem com essa doença, mas tem medo ou vergonha de procurar ajuda qualificada.

A culpa da depressão não é do depressivo. Ele não faz porque quer. Pode soar repetitivo, mas a repetição é importante se ajudar você a entender a seriedade do problema. Ninguém se mata... ninguém se mutila ou corta... se estiver bem psicologicamente,

Hoje o suicido mata mais do que a AIDS, mas não é tratado com a mesma seriedade por muitas pessoas. Nos anos 80 a ignorância fazia as pessoas acharem que o HIV era exclusividade de pessoas promiscuas. A mesma ignorância, hoje, faz essas mesmas pessoas acharem que o suicídio é recurso de covardes ou de pessoas que não sabem resolver seus problemas. Não. O suicídio é um ato desesperado de uma mente desesperada que já não tem mais paz de espírito.

A depressão é, sim, um problema de Saúde Pública, mas apenas 28 países no mundo todo parecem ter percebido isso e, portanto, criam políticas para prevenir o suicídio.

Tudo se torna ainda mais desolador quando você entende que muitos suicidas só chegaram a esse ponto por causa do preconceito que temem sofrer e que, consequentemente, traz falta de apoio, vergonha e piora ainda mais o quadro deixando o paciente cada vez mais desolado.

Sofrer com incompreensão é desesperador.

Se seus olhos começam a embaçar, você procura um oculista. Se você sente sintomas de bronquite, vai a um pneumologista. Se o peito está doendo, procura um cardiologista. Pensar em coisas positivas, rezar ou tomar sucos estranhos não vai consertar sua miopia, lhe deixar menos fleumático ou curar seu coração. Não. Você vai precisar de um médico. E é exatamente a mesma coisa com a depressão. Se VOCÊ resolve tudo comendo capim (o que, na verdade, não resolve nada) ou bebendo uma xícara do urina de manhã (sim, tem gente que faz isso), problema seu. Não imponha uma terapia alternativa e não científica para um problema grave. Assim como você não vai fazer aromaterapia para se tratar de um tumor no fígado.

Você sofre com depressão? Então pare de sentir vergonha. Procure ajuda. Um psiquiatra ou um psicólogo. Você ama alguém depressivo? Então cuide dessa pessoa, não ignore seu problema e nem imponha a ela as suas crenças pessoais. Não piore ainda mais a situação.

A terapia pode mudar a vida de uma pessoa. Em alguns casos, quando necessário, remédios podem trazer uma qualidade de vida que já não se acreditava mais existir. Mas você, depressivo, deve entender que o mundo não está contra você. É importante encontrar alguém que o apóie: seus pais, irmãos, namorada, namorado, amigos, parentes...

Se você não consegue ter vontade de nada – passear, comer, conversar ou mesmo acordar – entenda que você pode estar com depressão e procure um médico que possa fazer um diagnóstico. Assuma que precisa de ajuda (é muito importante) e busque-a. Psiquiatra não é ‘médico de louco’. Não. Ele é alguém que pode salvar a sua vida.

Mas, acima de tudo, não se isole. Não fique só. Quanto mais só, pior ficará o quadro.

E você que convive com alguém que pode estar com depressão, apóie. A sua ajuda pode evitar uma tragédia futura. Às vezes a pessoa “querendo chamar atenção” está, na verdade, gritando desesperadamente por ajuda da forma mais sutil que pôde encontrar.

Porém se você não tem recursos financeiros (de verdade) para buscar ajuda, procure em grupos de apoio como o Sem Transtorno (aqui consta uma lista com locais que atendem a=em várias cidades do Brasil: http://www.semtranstorno.com.br/atendimentos-psicologicos-e-psiquiatricos-gratuitos-ou-de-baixo-custo/) ou procure uma faculdade, como a SOCIESC (http://sociesc.org.br/pt/ibes/conteudo.php?id=1182&mnu=1235&top=0&crs=130) que ofereça esse serviço de apoio.

Se enquanto lê esse texto você tem algum tipo de pensamento intrusivo auto-destrutivo não se sinta só: quase 1 milhão de pessoas se matam por ano no mundo. Por favor, entre em contato com CVV no número 141 ou no site (http://www.cvv.org.br/). Podemos nem nos conhecer, mas você é importante para mim. E eu entendo a sua dor. Melhor do que queria.

No passado perdi uma namorada que se matou. Tínhamos cerca de 15 anos ambos e a cultura dela entendia o seppuku (suicídio ritual) como uma saída honrada para problemas difíceis. Recentemente namorei uma portadora de Borderline com pensamentos suicidas freqüentes. Espero que esteja bem e que um dia aceite se tratar. Minha própria avó, aos 90 anos, tento se matar porque não suportava mais viver depois da morte do meu avô.

Significava que essas pessoas não me amavam? Não. Significava que elas estavam desesperadas. E as que conseguiram ajuda, melhoraram significativamente. Apoio é a palavra chave. Companheirismo, cumplicidade e mostrar que você pode ser rocha em meio a uma duna de emoções.

É fundamental, também, que você entenda que ESTAR TRISTE NÃO É TER DEPRESSÃO. Perdeu o emprego? Perdeu um ente querido? Você não tem obrigação de estar feliz. Ninguém tem. Se triste não é pecado e, como diria Zeca Baleiro, “Lugar de ser feliz não é no supermercado”. Ter seus momentos de tristeza é perfeitamente saudável e aceitável. O problema é quando a situação persiste, o desânimo se torna generalizado e você perde a vontade de viver.

Se você está lendo e precisa conversar com um AMIGO, pode me adicionar em suas redes sociais, mandar mensagem em nossa fanpage e tentar desabafar. Às vezes é mais fácil fazer primeiro com um estranho. E mesmo não lhe conhecendo, eu gosto de você. Mas se você está aqui porque um parente mandou o link, entenda que essa foi uma forma sutil de pedir ajuda. E não a negue enquanto há tempo. Se não você poderá se arrepender quando for tarde demais.

A depressão é séria. Ela não é uma besteira da idade. Mas também não é algo legal que pode ser estampado em camisetas pra te tornar ‘diferentão’. É numa doença séria. Mas apenas um médico poderá diagnosticar se é depressão ou tirsteza motivada por algo.

Tanatologistas (especialistas em estudar a reação das pessoas à morte de entes queridos) afirmam que os três lutos mais preocupantes são os de amantes, animais de estimação ou celebridades. Às vezes uma pessoa tem uma relação extraconjugal por décadas. É errado, sim, mas não minimiza a dor da perda. Outras vezes as pessoas não entendem que quando morre um cãozinho, um gato, um cavalo ou outro tipo de bichinho, a dor pode ser a de perder um filho. E, pior ainda, muitas vezes as pessoas ridicularizam quem sofre pela morte de um ídolo. “Mas ele nem sabia que você existe”. Mas você sabia. E se sentia próximo a ele.

Sempre é importante procurar ajuda.

Pais e mães, se unam para entender a situação antes de tentar resolvê-la. Estudem um pouco e não se esqueçam de dar apoio. Senti-se protegido pode fazer toda a diferença nesse momento.

E se você sente depressão, busque ajuda. Procure alguém de confiança e busque um médico. Mas, acima de tudo, não se isole. A solução é letal para essa situação. Se você não tiver MESMO a quem procurar, precisar de um amigo e a solidão estiver consumindo você, entre em contato conosco. Pode ser pela fanpage ou pelo meu próprio Facebook (https://www.facebook.com/rick.blumenews). Não poderemos fazer diagnósticos e muito menos passar remédios, mas podemos conversar e te mostrar que você não está mais só.

E, por favor, compartilhem esse artigo (que ficou enorme) com o maior número de pessoas. Vamos elucidar esse problema grave, trazer luz à ignorância e apoio aos que se sentem abandonados.

Mas, acima de tudo, lembre-se: mesmo não nos conhecendo, gosto muito de você e sua vida é extremamente importante pra mim e para muita gente. Converse sobre suas dores. Deixe-se ouvir e ajudar. E assim, com a ajuda profissional certa, esse momento negro poderá passar logo.


>> SOBRE O AUTOR

Ricardo Latorre

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