O Maio Amarelo e os acidentes que não conseguimos evitar

O Maio Amarelo e os acidentes que não conseguimos evitar
Foto: Márcia Pontes

Thursday, 11 May 2017

Vocês já viram, leram, ouviram, presenciaram ou sentiram na pele a quantidade de acidentes em Blumenau e no estado com ainda mais evidência durante o Maio Amarelo?

O mês de Maio é aquele em que o país se agita pintado de amarelo, a cor da advertência pela vida no trânsito. Criado em 2014 na cidade de Indaiatuba (SP), pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) em apoio à Década de Ações da Segurança Viária (2011-2020), o Movimento incentiva a sociedade civil organizada e o poder público a atuarem juntos para evitar acidentes e a um diálogo construtivo em torno da busca de soluções para os principais problemas relacionados ao trânsito. O Maio Amarelo veio para ficar como já sabíamos, mas, apesar de todos os esforços não estamos conseguindo fazer com que o laço amarelo não mude de cor. 

Mas, o problema não é o simbólico mês de maio ou as ações preventivas que não estão sendo bem feitas: é o nosso cotidiano que não conhece calendários e datas. É a nossa rotina que vem sendo indevidamente se naturalizando em “mais um acidente ali”, “mais uma vítima acolá” em que as pessoas continuam fazendo escolhas erradas, mal pensadas, precipitadas, e que resultam em acidentes. Foi com os Mestres que aprendi que o acidente é a infração que deu errado em mais de 90% dos casos. E foi também com o Mestre e eternizado Reinier Rozestraten que todos aprenderam a fundamentar os seus trabalhos científicos e a citar os mais de 90% do peso que tem o comportamento humano para a ocorrência de acidentes. 

Nesses 4 anos representando o Maio Amarelo em Santa Catarina não foram poucas as vezes em que acordei com a notícia de mais uma ou mais mortes em acidentes de trânsito. Não foi uma ou outra vez que, em meio às ações preventivas, recebia a notícia de um acidente grave ali ou uma morte acolá. Minutos antes de solenidades de abertura do Movimento em diferentes cidades, anunciava-se em alto e bom som que mais uma vida tinha se perdido ali bem perto de nós. 

Só quem vive o Maio Amarelo como uma causa de dentro para fora sabe bem que não é a rodovia que mata, que não é o carro, a moto ou qualquer outro veículo. É gente matando gente naquilo que chamo de um verdadeiro e perigoso genocídio sobre rodas. 

Justamente em pleno mês de Maio, com tantas ações de sensibilização para a conscientização para o trânsito seguro, com tantos estímulos positivos para a prevenção ainda vejamos crianças morrendo na tenra idade (muitos ainda bebês) porque algum adulto que deveria cuidar dela fez a escolha errada de não protegê-la na cadeirinha ou no dispositivo adequado à sua idade. 

Não dá para aceitar que pessoas percam a vida e tenham ido embora cedo demais porque deixaram de usar o cinto de segurança, porque dirigiram depois de ingerir bebida alcoólica, porque aceleraram demais, porque estavam off no trânsito e online no celular ao volante. Dentre eles, muitos que nos consideravam os “chatos do trânsito” que sempre repetem o mesmo discurso e postagens amarelas de autocuidados.   

O que dizer então dos parceiros que perdemos justamente em acidentes? Agentes de trânsito, policiais rodoviários, socorristas, bombeiros voluntários, gestores do trânsito e outros que tombaram no asfalto, campo de batalha entre a vida e a morte em que atuavam para salvar vidas? Pessoas que sempre dirigiram com cautela e atenção e tiveram a vida ceifada por um condutor imprudente.   

Na mesma linha, não conseguimos aceitar que obras e vias mal sinalizadas tenham concorrido para o acidente, ou que condutores mal formados tenham sido vítimas da própria imperícia quando empurrados para o trânsito por outros que ignoram as suas dificuldades ou por ansiedade para dirigir a qualquer custo? 

Maio é e sempre será o mês do simbolismo amarelo, um mês para que o nosso grito de socorro seja ouvido com mais força. Para que lembremos das injustiças, das imprudências, dos condutores que continuam dirigindo embriagados e matando inocentes em via pública. Um mês para lembrarmos das vítimas, de seus familiares, dos processos que mofam a anos engavetados e sem andamento, deixando ainda mais órfãos aqueles que vão enfraquecendo a esperança ao verem que depois de anos, a vida do seu pai, da sua mãe, do seu filho, marido ou esposa amada não valeu mais do que o pagamento de cestas básicas ou prestação de serviços comunitários que em nada sensibilizam o responsável pela tragédia. 

Talvez, o dia em que modifiquemos o secular calendário Juliano e façamos dele Maio o ano todo, ainda que simbólico e amarelo, quem sabe, as pessoas não precisem primeiro perder os seus entes queridos para começarem a fazer as escolhas mais seguras. Na vida e no trânsito. 

É fato que muitos aprendem com o Maio Amarelo e tornam as suas práticas e os deslocamentos mais seguros. Mas, não pode ser só no quinto mês do ano. É necessário que seja Maio Amarelo o ano todo, que seja mais que um movimento. É necessário que o Maio Amarelo seja uma filosofia do ato responsável assumida por todos como código de conduta que os guie pela vida e pelas vias, independente do papel que exerçam no trânsito. 

Reduzir acidentes é muito pouco. Nós queremos evitar, prevenir, assumir as nossas responsabilidades na vida e no trânsito. Porque para além de protagonistas dos acidentes de trânsito, possamos ser também os protagonistas da prevenção e da proteção à vida. 

Façamos todos os dias o Maio Amarelo.


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Márcia Pontes

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