Invasões de terra em Blumenau: como impedir a favelização?

Invasões de terra em Blumenau: como impedir a favelização?
Foto: Divulgação

Friday, 17 October 2025

Povos indígenas tomaram ilegalmente um terreno às margens da Via Expressa e isso, se nada for feito, pode ser o início de mais uma favela (chaga das grandes cidades).

Por volta do ano de 2018, um terreno na Via Expressa – próximo a onde está o monumento ‘Sementes’, de Guido Heuer, aos fundos da rodoviária – foi ilegalmente invadido.

A primeira ocupação, naquele ano, ocorreu por ciganos. Eles arrancaram cercas e portões, causando confusão no trânsito local. Brigas eram frequentes. Incêndios ocorriam periodicamente. Houve momentos onde a confusão agravou-se a tal nível que carros foram apedrejados na rua só por estarem passando pela via.

A prefeitura notificou o dono do terreno para que entrasse com ação de despejo para removê-los. A Secretaria de Desenvolvimento Social ofereceu assistência, mas foi recusada.

Depois que eles finalmente foram embora, famílias indígenas do povo Kaingang apropriaram-se do lugar. Lá, montaram pequenos abrigos para moradia e venda de artesanato.

Em 2020, a prefeitura tentou remover barracas vazias, mas um casal se recusou a sair e FUNAI interferiu para – como faz de costume – criar mais problemas do que trazer soluções. Hoje, tais barracas transformaram-se em casas de madeira. São cerca de 100 pessoas vivendo em condições precárias de saneamento, segurança ou infraestrutura.

A prefeitura sempre argumentou que o local é inadequado por oferecer riscos tanto para os moradores quanto para a população em geral. Em 2022, o Executivo derrubou um dos abrigos, gerando algum protesto e dividindo o grupo, do qual metade foi para o Progresso.

Em dezembro de 2023, de acordo com nota oficial da Prefeitura Municipal de Blumenau, o Poder Público entrou com uma ação civil solicitando a desocupação (em virtude da complexidade urbanística de manter moradias no local). Com isso, a administração municipal pretende conseguir – seja por meio do Governo Federal ou da própria FUNAI – um lugal adequado para o reassentamento. A ação ainda segue em andamento.

Enquanto isso, os indígenas reivindicam estruturas como água, energia e apoio para sua permanência sazonal, enquanto vendem produtos. Um delírio coletivo...

Um grande problema chamado FUNAI

Criada em 1967 – em plena Ditadura Militar – Fundação Nacional do Índio (FUNAI) tem sido uma estrutura cara e incapaz que acumula críticas por ineficiência, proselitismo e até lobby.

Desde que Lula reassumiu a presidência em seu terceiro governo, as mortes indígenas subiram 30% (de 2022 para 2023), com recordes de suicídios e invasões, como ocorrido entre os Yanomami. Ele é acusado de – assim como fazia quando sindicalista – promover uma falsa conciliação, dizendo defender os direitos indígenas, mas priorizando acordos com ruralistas via PECs.

Um órgão sucateado que transforma indígenas em meras mascotes políticas priorizando o isolamento à integração, a FUNAI é um grande desperdício de recurso público.

Seus esboços de progresso têm sido meramente estéticos há quase 60 anos. O órgão estimula disputas para justificar sua própria existência. Ela ataca iniciativas como o Marco Temporal, ignorando que a falta de limite em expansões fomenta mais e mais conflitos.

Sua única utilidade prática é servir como cabide de empregos para cerca de 2,5 mil pessoas.

Mas a questão que fica é justamente: de que forma a integração entre povos originários se daria, sem um agente mediador?

Como outros países lidam com a questão indigenista

A trajetória dos povos nativos nos Estados Unidos é profundamente mais sangrenta do que a nossa. Genocídios e assimilação forçada dizimaram de 80% a 90% da população indígena.

Remoções brutais como a Trilha das Lágrimas (1830) causou a morte em massa de milhares de Cherokees. Tratados forçados oprimiam progressivamente aquelas pessoas. A Lei Dawes, de 1887, dividiu terras tribais em lotes individuais para promover assimilação, resultando na perda de cerca de dois terços das terras indígenas até 1934. A herança da Conquista do Oeste foi nefasta para quem legitimamente vivia naquela terra desde antes de Colombo.

Contudo, o ponto de virada veio em 1968, com a fundação do American Indian Movement. Percebendo que a relocação indígena dos anos 50 (que moveu tribos para centros urbanos) os relegou à pobreza e que o Indian Reorganization Act dos anos 30 (que reconhecia certa autonomia para os governos tribais) funcionou, eles decidiram mudar o foco.

Dessa forma, em 1975, o Indian Self-Determination and Education Assistance Act transferiu controle de serviços como saúde e educação para as tribos, fomentando autonomia e reduzindo dependência federal. Foi quando os povos passaram a ter mais dignidade e respeito.

A Indian Gaming Regulatory Act, de 1988, acelerou o progresso econômico indígena permitindo cassinos em terras tribais e gerando bilhões em receita para tribos como os Seminole e Navajo – financiando infraestrutura, educação e preservação cultural sem abandonar tradições.

Hoje, há 574 tribos reconhecidas federalmente, com territórios soberanos onde aplicam leis próprias. O respeito cresceu via reconciliação. O Native American Graves Protection and Repatriation Act, de 1990, garantiu a devolução de artefatos, aumentou a representatividade política, diminui enormemente a pobreza e integrou naturalmente todas as culturas.

Não foi necessária uma Fundação dispendiosa com resultados pífios, mas sim o singelo ato de reconhecer que índios são pessoas capazes, inteligentes e promissoras.

Algo similar ao que os Estados Unidos fizeram, também foi feito pelo Canadá. Já a Austrália deu o uso das terras onde seus aborígenes já viviam (sem fomentar invasões), enquanto os capacitou como fortíssimos elementos turísticos (sem perder o respeito ritualístico que eles merecem). Na Nova Zelândia, boa parte do governo é composta de maoris.

São países que tratam seus indígenas como pessoas titulares da dignidade que merecem. Diferente disso, o Brasil trata seus índios como animais em um zoológico. Isso é desumano.

A complexa questão dos povos originários

Sejamos honestos: a história da Humanidade é muito feia. É um mosaico de violência e injustiças que parece não ter fim. Porém, apesar de tudo, é a nossa história. Somos nós. Ignorantes e imperfeitos, mas sempre em busca de algo que sequer sabemos o que é.

Há 300 mil anos nós brigamos. Seja por terra, recursos ou credo. Ao vencedor, tudo. Ao perdedor – na melhor das hipóteses – sobra a vida (embora, raramente, acompanhada de liberdade). É terrível, claro. Mas é o cruel caminho que nossa beligerante espécie percorreu até aqui e que continua teimando em querer seguir.

Foi assim que a civilização cresceu. As primeiras cidades da Crescente Fértil foram erigidas sobre onde seus oponentes derrotados viveram. E morreram. Assim como Ur e Jericó ascenderam caíram. Os egípcios unificaram o Nilo, mas tombaram frente o poderio militar de gregos, persas e romanos. Roma quase dominou o mundo, mas sucumbiu ante vândalos, visigodos e crises internas que eclodiam em guerras civis. Mongóis, otomanos. Sempre conquista. Terrível ou não, é assim que nosso mundo é. Somos uma espécie avessa à paz.

Não foi diferente quando os europeus descobriram as Américas. Os incas não tinham como se defender das armas de Pizarro. Sejam elefantes de guerra ou arqueiros montados, a tecnologia militar sempre resulta em tragédia. Milhares de índios morreram. Suas terras foram tomadas. Seus recursos foram apropriados. Péssimo, mas nada fora do nosso padrão mesquinho.

Bem... mas os chineses também passaram por agruras terríveis. A China sofreu humilhações inomináveis, fosse pelos britânicos nas Guerras do Ópio, fosse pelos japoneses que os invadiram. Mas não houve vitimismo. Nem foram criadas leis estúpidas para forçar o Japão a ceder direitos em detrimento dos chineses. Eles – com tempo e esforço – simplesmente se reergueram e tomaram o seu lugar como a segunda potência mais poderosa do mundo.

O Brasil foi colônia de Portugal. Assim como os índios, foi explorado por um ‘oponente’ consideravelmente mais forte. E hoje superamos os portugueses em muitos aspectos relevantes. Bem como Estados Unidos com Inglaterra. Ou os hebreus que deixam o Êxodo e o Holocausto e se tornaram a poderosa Israel. Sem vitimismo, leis questionáveis ou militância vazia.

Os índios não são animais. E tratá-los como se fossem é desonrar o que representam. Mas também não são santos. Alguns fazem pedágios ilegais em rodovias, invadem propriedades privadas e criam cenas de horror em comunidades (como pequenas cidades rurais paranaenses). O ‘bom selvagem’ só existiu na mente de Jean-Jacques Rousseau.

São pessoas complexas – com grandes virtudes e profundos defeitos – que não devem sofrer nenhum preconceito, mas também não devem ser glorificadas. Há repartições públicas que exigem que visitantes se cadastrem – por segurança – mas não pedem cadastro de índios. Por quê? Um índio é incapaz de matar? Paulinho Paiakan fez até pior...

O Brasil precisa parar de romantizar o atraso. O mundo evoluiu. Não é normal achar que nativos (literalmente) analfabetos têm qualquer chance de independência financeira num mundo que discute as IAs na Quarta Revolução Industrial. É desumano incentivar que tribos mal dominem o fogo enquanto robôs e carros elétricos lideram a vanguarda. Isso é cruel e nada tem a ver com respeito às tradições, mas sim com garantir a dependência política.

Judeus preservam o Talmude e celebram o Shabat, enquanto têm a tecnologia militar mais avançada do planeta. Japoneses cultivam bonsai, mantém sua cerimônia Chanoyu e se dedicam a Ikebana, enquanto é o líder global em tecnologia e robótica. Alemães conservam tradições centenárias e priorizam o Gründlichkeit, enquanto têm a engenharia mais precisa da Europa. O Mundo Islâmico honra Meca, mas projeta o futuro para os Emirados Árabes. Isso é respeitar a tradição enquanto se abraça um futuro digno e próspero para um povo.

O que fazemos é muito diferente. Relegamos nossos índios ao posto de cidadãos de segunda classe enquanto alegamos fazer isso para protegê-los. Sem instrução, integração ou mesmo espaço no mundo contemporâneo. Apenas um quintal onde os amarramos com falsas convicções e defesas vazias.

E o que sobra para aqueles que não aceitam as migalhas dos homens brancos (que dizem se importar como eles enquanto os arruínam): viver em precárias invasões urbanas – como a Jõ Tõ Coziklãg, uma espécie de maloca que mistura indígenas e mendigos na Rua Itajaí – ou o assentamento às margens da Via Expressa. A semente de uma favela em frente ao monumento ‘Sementes’. Poeticamente trágico. Ultrajante.

E, infelizmente, onde há favela, não há dignidade. Mas por favor, não confunda: moradores de favela têm dignidade, mas o indigno local onde vivem tira isso deles.

Não podemos permitir que Blumenau seja favelizada

Somos uma cidade linda, rica e bem organizada. De uns anos para cá, a migração descontrolada está diminuindo uma qualidade de vida que, antes, era quase idílica.

Favelas são ruins. Péssimas. Um erro. A prova de que o Estadi fracassou.

Dos anos 50 para cá, o Rio de Janeiro (RJ) passou a ter mais de mil favelas. Uma ferida aberta no lugar que, antes, encantava o planeta inteiro. São Paulo (SP) tem milhões de habitantes vivendo, adoecendo e morrendo nesses bolsões de miséria. Em Manaus (AM), 34,7% das pessoas moram nesses locais insalubres. Não podemos deixar isso acontecer aqui.

A migração desenfreada é um problema que toda a comunidade sente. Sem controle de quem entra, a administração municipal não sabe quantos novos leitos de hospital serão necessários, ou vagas de creche, ou novas ruas. Assim, o serviço público, colapsa. E isso já começou.

Locais sem infraestrutura básica (como esgoto, água potável ou coleta de lixo) são criadouros de epidemias, nascedouros de doenças (como diarreia e dengue) e, dessa forma, a longevidade de seus habitantes é sensivelmente menor. Isso sem falar na qualidade de vida.

Ocupações em áreas de risco aumentam vulnerabilidade a enchentes, deslizamentos e erosão do solo, com impactos no consumo de recursos naturais e na sustentabilidade urbana. Em Blumenau, conhecida por inundações históricas, a migração pode intensificar isso, pressionando ecossistemas locais e custos com desastres. Ou já nos esquecemos das tragédias da década de 80, 2008, 2011 e até do ano passado.

Além disso, a expansão informal pressiona a infraestrutura geral, aumentando custos públicos para remediação e reduzindo atratividade para investimentos. Economia subterrânea (como comércio ilegal) pode destruir ecossistemas inteiros e multiplicar riscos sociais.

Sem mencionar o principal: o aumento da criminalidade.

Favelas frequentemente carecem de iluminação pública e vias acessíveis, facilitando crimes como roubos, assassinatos e tráfico de drogas. Isso cria uma sensação de insegurança que se espalha para áreas vizinhas, moldando o urbanismo com mais grades, muros e vigilância privada, o que paradoxalmente pode aumentar o isolamento social. Sem mencionar que – em muitos casos – o crime organizado age como financiador de novas favelas, porque as entende como seu território de domínio alheio às autoridades brasileiras.

E já estamos sentindo isso. Com o influxo migratório, há relatos de crescimento na informalidade e pequenos delitos, impactando a percepção de segurança em uma cidade tradicionalmente tranquila e ordeira.

Conclusão

Geralmente, é assim que uma favela nasce. Barracos criados por pessoas marginalizadas em terrenos invadidos. Começa pequeno. Sempre começa assim. São duas ou três famílias. Hoje, são cerca de 100 pessoas. O terreno não é mais o bastante e elas invadem as áreas vizinhas.

É necessário que uma providência seja urgentemente tomada. Antes que a ocupação possa se tornar tão complexa que garanta sua própria permanência insalubre e inadmissível.

Blumenau tem autoridades plenamente capazes de fiscalizar e proteger seu desenvolvimento urbano. Desde o Executivo Municipal até a Câmara de Vereadores – com bons nomes como Bruno Cunha (Solidariedade), Bruno Win (Novo), Diego Nasato (Novo) ou Flavinho Linhares (PL) – até o coordenador regional da Defesa Civil Alexandre Echevenguy e o comandante do 10º Batalhão da Polícia Militar de Blumenau, tenente-coronel Heintje Heerdt.

Mas mesmo com a boa vontade desses agentes públicos acima listados, muito pouco se pode fazer quando o Judiciário é moroso (quando não ideológico), órgãos como a FUNAI criam problemas onde deveria haver soluções e o Governo Federal pinta erros como se fossem manifestações de espontaneidade, como faz no caso das favelas.

O Brasil tem muitos desafios.

Dar dignidade aos índios, garantindo respeito às suas tradições ancestrais enquanto os prepara para um futuro promissor, é um deles.

Contudo, evitar que uma das poucas cidades que não estão manchadas pela favelização desenfreada seja maculadas, é um desafio muito mais emergencial. Algo que devemos priorizar ao custo de nossa própria qualidade de vida. Não permitamos que Blumenau deixe de ser o jardim que é.

Que o monumento de Guido Heuer simbolize a ‘semente’ de nossa resiliência social.

Favela à grande de uma grande avenida de São Paulo: um risco que Blumenau deve evitar.
Favela à beira de uma grande avenida de São Paulo: um risco que Blumenau deve evitar.


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Rick

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