O Neumarkt e o meme: vamos falar sério

Thursday, 23 April 2020
Sem histeria coletiva e sem irresponsabilidade... não existe ninguém certo nessa história dantesca.
O shopping Neumarkt não cansa de constranger a si próprio. Como se as goteiras não bastassem – ou a briga com uma pastelaria – mais uma vez o empreendimento do grupo Almeida Júnior colocou-se em uma posição degradante: virou um meme.
Ontem os shoppings e centros comerciais tiveram suas reaberturas autorizadas em Santa Catarina, desde que obedecendo estritamente regras de segurança sanitária. E eis que o Neumarkt abriu suas portas às 12h com tapete vermelho, fila de funcionários aplaudindo os clientes e saxofonista tocando ‘Have You Ever Seen The Rain?’ do Creedance enquanto uma pequena aglomeração de pessoas entrava, tal qual rebanho, no estabelecimento.
É a segunda vez que o shopping é ridicularizado nacionalmente. A primeira, anos atrás, foi quando figurou numa lista de shoppings mais bregas do Brasil por ter uma livraria tocando música gospel no último volume em frente à finada Brunette, no qual ambos os sons competiam logo na entrada. Seria hilário, se não fosse deprimente.
Contudo – e esse é o ponto em que vamos, como sempre, desagradar todo mundo – o episódio está sendo supervalorizado. Apesar de ser uma aglomeração, aquele número de pessoas estava certamente abaixo dos 30% que o local pode comportar. E sem público não haveria motivos para estar aberto.
Entre as 12h e as 14h houve muita gente passeando pelo local. O mesmo número de pessoas que, dias atrás, passeava pelos supermercados sem causar o mesmo espanto seletivo. Mas após as 14h o movimento começou a cair. Às 17h estivemos no local para registrar e, com exceção de alguns corredores principais, o Neumarkt tinha pouquíssimas pessoas. Algumas grandes lojas estavam fechadas com datas de reabertura penduradas nas portas. Outras, como a Riachuelo, estavam fechadas avisando que seria por tempo indeterminado.
A retomada da Economia vai ser lenta. Os estoques estão cheios e algumas lojas já estão começando as promoções para rodar o que ficou 36 dias parado. Os prognósticos não são bons. Porém, fora o saxofonista violando claramente deliberação do governo do estado, o shopping cumpriu, sim, todas as regras.
Alarmismo barato não leva ninguém a lugar algum. Mas irresponsabilidade desenfreada também não. Quem pensa que sair na rua é equivalente a morrer é ignorante e está errado. Mas que acha que o vírus não é mais um risco, está tão errado e é tão ignorante quanto.
Aos poucos a sociedade vai restabelecendo rotinas. Mas, até que haja uma vacina ou remédio de eficácia 100% garantida em relação à Covid-19, todos devemos estar sob alerta.
Em nota, o Grupo Almeida Júnior reiterou: “Reabrimos nossos shoppings aplaudindo as pessoas no horário da abertura. Foi uma forma carinhosa de demonstrar o respeito que temos pelos nossos clientes. Estamos atendendo todas as determinações estabelecidas e inclusive aplicamos em todos os ambientes de eventual contato pelos consumidores produto que importamos dos EUA utilizado nos maiores centros do mundo que elimina até 99,99% dos micro-organismos. O movimento durante este primeiro dia de abertura esteve 100% dentro dos padrões estabelecidos”. Apenas não comentou sobre a idéia estúpida do saxofonista.
O governador Carlos Moisés (PSL) avisou – "A gente não consegue aceitar que as pessoas se aglomerem em shoppings. Se o estabelecimento não consegue administrar o seu público, com restrição de entrada, e as pessoas estão se comportando como se tivesse voltado ao normal, cabe ao poder público lacrar o estabelecimento" – o que, dessa vez, foi bem consciencioso.
O juiz Frederico Andrade Siegel, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), determinou que o shopping adotasse medidas de segurança para evitar a propagação do vírus depois da publicação do vídeo. Caso desobedeça, o empreendimento poderá ser punido com multa diária de R$ 500 mil e até fechado. Não que eles se importem com multas, uma vez que no caso da pastelaria, o Neumarkt foi condenado a pagar multas diárias e nem por isso obedeceu a Justiça.
Blumenau tem mais dois shoppings: o Park Europeu e o Norte Shopping. Sendo o último também do Grupo Almeida Júnior. No entanto apenas o Neumarkt insiste em fazer esse tipo ridículo de iniciativa que apenas serve para desmoralizá-lo. O que deixa a impressão de que a responsabilidade pelo episódio lamentável não é do Grupo, mas sim da administração daquele shopping especificamente.
Você tem vontade de bater perna? Claro que tem. Todo mundo tem. Mas a Covid-19 ainda não tem cura. Os números de infecção são pequenos? São. Uma média de 0,015% em Santa Catarina. Mas ainda assim existe. Matou 0,00052% da nossa população, mas matou. Não importa se é muita ou pouca gente, esse vírus está matando.
Ninguém vai morrer ao sair nas ruas. A Economia não vai colapsar e o Capitalismo não vai acabar. Como não acabou com a quebra da Bolsa em 2008. Ou na década de 20. A humanidade não vai ser dizimada pelo vírus como não foi pelo holocausto nuclear da Guerra Fria que nunca aconteceu. Ninguém vai queimar até a morte por causa do buraco na camada de ozônio que apavorava as pessoas nos anos 80 e hoje ninguém mais lembra. Campos de concentração e caça às minorias não aconteceu no atual Governo Federal como tanta gente apavorada jurava que aconteceria. Chega de histeria. É patético. Contudo, não seja irresponsável, pô. Não dê mole pro azar. O vírus existe. Nada de ficar passeando sem necessidade. Não sejamos levianos. Evitemos sair por motivos fúteis. E, se precisarmos sair, tomemos os devidos cuidados.
Isso vai passar. Vai haver um remédio. Uma vacina. E esse vírus será expurgado como a varíola, um dia. Mas ainda não. Ainda não tem tratamento totalmente comprovado. Não pegue. Não contamine os outros. E vai haver recessão. Óbvio que vai. E vamos vencê-la. Como vencemos pós-Sarney e pós-Dilma. Sem alarmismo barato. Ninguém age de forma inteligente quando está desesperado.
E você que diz que “quem sai de casa deveria abrir mão do direito aos leitos hospitalares”... você é parte de um dos maiores problemas do país: a ignorância reacionária. Seus pais devem sentir muita vergonha.