Advogado agride mãe de 84 anos e reabre um debate.

Advogado agride mãe de 84 anos e reabre um debate.
Foto: Divulgação

Friday, 02 June 2017

Numa época em que se fala em violência contra minorias (algumas delas numericamente questionáveis) como estamos tratando nossos próprios pais e avós?

Respeitar e cuidar dos idosos, mais do que uma obrigação, é uma honra que recai sobre nós que jamais teríamos chegado à fase adulta da forma que chegamos se essas pessoas não tivessem dedicado suas vidas a garantir nossa segurança e crescimento pessoal.

Claro que é dizer isso é lugar-comum. Todo mundo diz isso. Mas quantos praticam?

Planos de saúde usam idosos felizes em seus comerciais escondendo a putrefata verdade de que depois de certa idade eles sequer aceitam o convênio dessas pessoas. Ou seja: no momento em que mais precisam de cuidados médicos, as instituições que garantes os interesses daqueles que fizeram o Juramento de Hipócrates lhes viram as costas.

Bancos, como o Itaú, mostram duas simpáticas senhoras moderninhas falando sobre aplicativos e benefícios que só servem para confundir grande parcela da população de terceira idade e para que as instituições financeiras economizem dinheiro em papel. Aliás... mesmas instituições que de forma inconstitucional fazem empréstimos consignados  a aposentados violando impunemente a lei que proíbe qualquer um de reter a fonte de renda de alguém.

Daí você pode dizer “o Brasil não respeita nem seus idosos”, mas se espantaria em saber que há países piores. O Japão, onde já vivi, é conhecido pelo respeito aos antepassados, mas o país não tem previdência e conta com preços altíssimos em remédios. Dessa forma é muito comum pessoas de idade em praças tentando conseguir algum dinheiro ou, pior, sujeitando-se a trabalhos análogos à escravidão em fábricas para poderem ter o que comer.

Qualquer um que já tenha visitado um ancionato pôde perceber, quero crer que com indignação, que muitas pessoas largam seus pais, mães ou avós lá e nunca mais voltam. Isso é respeito e amor àqueles que cuidaram de nós quando não podíamos fazê-lo sozinhos?

No final passado viralizou por toda a internet um vídeo de um cidadão chamado Roberto Elisio Coutinho – advogado maranhense – gritando, coagindo e até ameaçando fisicamente sua própria mãe, de 84 anos. Em vista da cena canalha flagrada (abaixo no vídeo) ele foi preso, mas algumas pessoas ainda tentaram justificar o injustificável, dizendo que a senhora estava com algum tipo de ‘demência’ e que essas ocasiões costumam impacientar as pessoas.

Quando esse indivíduo era criança ele, certamente, não sabia falar, andar, usar o banheiro ou limpar-se sozinho. E essa senhora, tratada com agressão física no vídeo, contribui para que ele cresceu para se tornar o leitão à pororoca que se tornou. E essa foi a retribuição.

Claro que nenhuma mãe (ou, pelo menos, uma boa mãe) espera retribuição. Mas não seria isso o mínimo? Ou será que essa senhora fez algo tão monstruoso que sequer mereceu respeito no final de sua vida?

Minha avó faleceu, infelizmente, aos 90 anos. No finalzinho de sua vida se estava fortemente abatida pelo Alzheimer. Passava as madrugadas fazendo barulhos altos sem razão nenhuma, teimava em dizer que já tinha almoçado (ignorando que havia acabado de acordar) e todos os tipos de limitações que alguém com essa idade pode ter.

Na época era complicado encontrar médicos que quisessem atendê-la e por mais de uma vez ouvimos, inclusive de um geriatra, a frase “é que ela está muito velhinha”. E daí? Jogamos fora? Será que a sociedade está tão despreparada assim para lidar com pessoas de idade avançada? Sou será que isso é um avançadíssimo grau de insensibilidade?

Houve até um cardiologista que sugeriu não trocar o marca-passo (que já era necessário) porque seria “um gasto de dinheiro muito grande com alguém que já está no fim da vida”. Não. A preocupação dele não foi se ela resistiria à uma intervenção cirúrgica. A preocupação dele, amigo de longa data da família, foi não gastar dinheiro com uma das pessoas que mais amávamos em nossas vidas. Algo que indigna e deprime simultaneamente.

Idosos precisam e, acima de tudo, merecem atenção. Eles geralmente gostam de conversar, contar suas ricas experiências de vida e sentir que ainda fazem parte importante da sociedade. E fazem. Mas se você não pode ou quer lhes dar esse pequeno regalo, pelo menos os respeite.

Esse sujeito do Maranhão certamente não foi o primeiro e tampouco será o último a agredir uma pessoa de idade (no caso, a própria mãe). Que sua pena seja exemplar. Que as pessoas incapazes de cuidar daqueles que nos sucederam os tratem bem, se não por respeito, por medo do que lhes possa acontecer. Por mais que essa seja uma necessidade triste.

Afinal, que futuro tem uma sociedade que no presente não glorifica seu passado?

Lembrando sempre, claro, que hoje somos jovens e independentes, mas um dia seremos nós as figuras relegadas às sombras do próprio passado. O exemplo que você está deixando para seu filhos ao lidar com seus pais é a forma com a qual você deseja que lidem com você?

Ainda sobre o caso acima, um vídeo sobre a prisão do dissimulado criminoso (que teria levado, com justiça, uma surra na cadeia):

 


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Ricardo Latorre

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