Isenção do IR até R$ 5 mil tem potencial inflacionário

Friday, 10 October 2025
Se confirmado, o cenário vai inibir cortes da taxa básica de juros.
A isenção do IR (Imposto de Renda) para os brasileiros que recebem até R$ 5.000, aprovada pela Câmara no dia 1º e que ainda precisa passar pelo Senado, deve injetar R$ 31,25 bilhões na economia. Economistas avaliam, no entanto, que a medida tende a estimular o consumo, ganhar potencial inflacionário e desestimular o BC (Banco Central) a cortar a taxa básica de juros.
O que aconteceu
Isenção do Imposto de Renda ganha forma para valer a partir de 2026. A proposta aprovada pela Câmara dos Deputados vai representar um desconto menor na folha salarial dos profissionais com renda mensal entre R$ 3.036 e R$ 7.350. Se aprovada também pelo Senado, a isenção integral valerá para salários de até R$ 5.000 e será proporcional aos demais beneficiados.
Regra vai garantir praticamente um 14º salário a alguns profissionais. A maior economia nominal será recebida por aqueles com remuneração mensal equivalente ao teto da isenção, de R$ 5.000. O rendimento desses trabalhadores subirá R$ 312,89 e resultará na economia anual (já com o 13º estimado) de R$ 4.067,57, valor equivalente a 81,4% do salário.
Proposta ainda depende do aval do Senado antes de ser sancionada. Para atender aos desejos do governo e começar a valer já em 2026, a isenção do Imposto de Renda precisa ser aprovada pelos senadores. Caso a medida seja alterada, ela retornará à Câmara para uma nova votação.
Promessa de campanha do governo Lula tem potencial inflacionário. A reversão da renda extra em consumo é recebida por economistas com receio. O alerta considera que a demanda pelos bens e serviços tende a expandir e resultar na elevação dos preços. "Ao liberar R$ 32,8 bilhões para consumo, há uma pressão de demanda imediata, especialmente nos setores mais sensíveis, como supermercados, serviços pessoais e transportes", afirma Carlos Honorato, professor da FIA Business School.
Principal impacto da isenção deve ser nos preços do setor de serviços. Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, calcula que o benefício tende a elevar em 0,6 ponto percentual o custo dos serviços e resultar no aumento de até 0,2 ponto percentual no IPCA ao final de 2026. Ele avalia que a distribuição gradual inibe um efeito mais expressivo. "Todo mês o contribuinte vai ter um pouco menos de imposto a pagar e o fato de ser diluído minimiza um pouco o impacto", afirma.
Estimativas do governo preveem que 15 milhões serão beneficiados. As projeções apresentadas pelo Ministério da Fazenda consideram que 10 milhões ficarão isentos de imposto de renda. Outros 5 milhões terão a cobrança reduzida por receberem salários entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350.
Efeito inflacionário do benefício tributário não é unanimidade. O presidente do Banco de Ribeirão Preto, Nelson Rocha Augusto, descarta que a isenção representará uma relevante expansão do consumo a ponto de estimular a inflação. "O volume de dinheiro vai depender das despesas que as famílias têm com o endividamento", afirma.
Beneficiados planejam pagar as contas, investir e ampliar o consumo. As possibilidades foram listadas ao UOL por brasileiros que recebem até R$ 5.000. Ainda que a destinação seja diversificada, Honorato explica que qualquer injeção de dinheiro na economia estimula a inflação. "Mesmo que parte dos beneficiados use essa renda extra para amortizar dívidas, o impacto inflacionário não desaparece, apenas muda de tempo e de canal", avalia ele.
E os juros?
Se confirmado, o cenário vai inibir cortes da taxa básica de juros. Atualmente em 15% ao ano, a Selic tem o maior patamar em quase 20 anos. A ferramenta utilizada pelo BC contra a inflação é adotada para desestimular o crédito, frear o consumo e, consequentemente, conter a alta dos preços. Honorato afirma que o cenário é resultado do "foco cego" de levar o IPCA ao centro da meta de 3% no acumulado de 12 meses. "O mercado financeiro vai aplaudir, mas o país pagará o preço do conservadorismo monetário travestido de prudência", diz ele.
BC prevê a manutenção dos juros altos por um período considerável. Na ata da última reunião, os diretores do Copom (Comitê de Política Monetária) justificam que a permanência da taxa Selic no patamar atual ocorreu porque o avanço dos preços está "pressionado pela demanda". A avaliação ainda desconsidera o bônus que passará a integrar a folha salarial.