MMA passou perto de ser proibido, mas a democracia venceu

MMA passou perto de ser proibido, mas a democracia venceu
Foto: Divulgação

Monday, 29 October 2018

Ex-senador dos EUA, John McCain advogou contra o Vale Tudo, mas nunca foi anti-democrático.

Era uma vez um tempo em que o MMA era marginalizado em quase todo o planeta e passou perto de ser proibido nos Estados Unidos, país em que, hoje, o UFC prospera e será transmitido pela ESPN, do Grupo Disney, a partir do ano que vem. Não faz tanto tempo assim, na verdade. No Brasil, por exemplo, foi necessário um chute de Anderson Silva na cara de Vitor Belfort, no recente ano de 2011, para que o esporte perdesse o estigma negativo que tinha por aqui.

Em Nova York, uma decisão autoritária da Comissão Atlética estadual deixou, até 2016, inviável a prática da modalidade no Madison Square Garden , por exemplo, ginásio com tradição secular em promover lutas de boxe. Para que um confronto de MMA fosse realizado, era preciso que os combatentes subissem em um ringue e utilizassem capacetes e luvas de boxe, exigências que descaraterizariam a modalidade.

Em 2009, José Mentor (PT), então deputado federal por São Paulo, criou o Projeto de Lei (PL) 5.534/09, com o objetivo de proibir a transmissão de eventos de MMA em canais de TV aberta. O PL teve seu mérito discutido na Câmara e acabou arquivado, a argumentação de que o MMA estimularia a violência e as comparações feitas pelo parlamentar, de que as lutas seriam como cigarro e álcool, por isso não deveriam ser veiculadas, não foram convincentes. Tudo correu dentro de um Estado Democrático de Direito, sem autoritarismo.

John McCain (1936 - 2018), ex-senador norte-americano e que morreu há dois meses, foi mais longe do que Mentor. Nos anos 1990, o então parlamentar republicano advogou pela proibição dessa prática esportiva nos Estados Unidos. O movimento contra o Vale Tudo, como a modalidade era conhecida em seus primeiros anos, fez com que o esporte passasse por uma adaptação necessária e assim surgiram as Regras Unificadas do MMA.

Veja, eu não acredito que o que é legal necessariamente é o correto. Eu nunca iria concordar com a ilegalidade do MMA, mas a primeira batalha deve ser sempre travada dentro dos limites institucionais. Injustiças respaldadas por leis, como o apartheid na África do Sul, devem ser combatidas, o tempo todo e a todo custo.

McCain foi radical? Em algum grau, sim. Mas também não cruzou os limites da democracia. O MMA não foi proibido nos EUA, passou por modificações, ganhou regras civilizadas e continua existindo. Há dois anos, o grupo WME-IMG pagou US$ 4 bilhões à Zuffa para comprar os direitos do UFC.

Antes de morrer, McCain disse que seguia sem gostar de MMA, “mas não tinha mais objeções”. McCain foi um militar da marinha que lutou na Guerra do Vietnã, foi capturado, torturado e, quando retornou, dedicou o resto da vida a servir o país dele como parlamentar. Foi um político tão respeitoso aos valores da democracia que perdeu uma eleição presidencial para Barack Obama, em 2008, e aceitou a derrota. Tão democrático que se recusou a apoiar a candidatura de Donald Trump, em 2016, embora ambos representassem o Partido Republicano.

Confesso que não estou a par da maior parte da atuação de McCain na vida pública, a qual começou como deputado federal pelo Estado do Arizona, em 1983. Como qualquer parlamentar, esteve sujeito a erros e acertos. Mas reconheço que ele tinha razão quando, nos anos 1990, comparou o Vale Tudo a uma espécie de rinha humana e o admiro por admitir que o MMA como existe hoje é, no mínimo, tolerável. Na política e no esporte, que sempre possamos ser aliados ou adversários, nunca inimigos –  e sempre com democracia.


>> SOBRE O AUTOR

Redação

>> COMPARTILHE