BRK e AGIR só querem o seu dinheiro

Friday, 23 May 2025
Em uma audiência vexatória na Câmara dos Vereadores, defensores do reajuste de 15% na tarifa de esgoto sequer apresentaram planilhas embasando o rombo e Paulo Costa optou por não ir.
Nessa quinta-feira (22), representantes da BRK, do Samae e da Agir (Agência Intermunicipal de Regulação do Médio Vale do Itajaí) estiveram na Câmara dos Vereadores de Blumenau para explicar um reajuste de 15,9% na tarifa de esgoto.
Os convocados pela Câmara foram André Domingos Goetzinger (gerente de Regulação Econômica da AGIR), Cleber Renato da Silva (diretor de contratos da BRK há mais de uma década) e Alexandre de Vargas (presidente do Samae). A convocação atendeu aos requerimentos dos vereadores Ito de Souza (PL) e Adriano Pereira (PT).
Paulo Costa – diretor-geral da AGIR – não atendeu à convocação.
Em seu questionamento, o vereador Gilson de Souza (União) usou o fato de que o Samae afirmou reiteradas vezes que o prefeito Egídio Ferrari só autorizou o reajuste tarifário porque foi recomendado pela AGIR, perguntando se a agência teria obrigado o município a assinar tal contrato. Goetzinger tentou justificar, mas não respondeu objetivamente à pergunta.
Já Bruno Win (Novo) destacou algumas inconsistências na terceira Revisão Tarifária Ordinária (RTO), como a tentativa da BRK de classificar como investimento uma despesa de manutenção na Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do Garcia – frisando que isso é proibido – além do não cumprimento de 205 quilômetros de rede de esgoto previstos contratualmente e a recomendação para a realização de auditoria técnica completa em todas as obras declaradas pela concessionária. Dessa forma, ele apontou a incoerência entre ajustes negativos passados e o atual ajuste positivo, perguntando – entre outras coisas – se o comitê de regulação foi quem aprovou o quinto aditivo contratual ou se apenas o diretor Paulo Costa o fez. Goetzinger, mais uma vez, se perdeu em tecnicidades e sua resposta foi pouco assertiva, sendo necessário refazer a pergunta: e o quinto aditivo NÃO passou por nenhum comitê, ou seja...
Jean Volpato (PT) relembrou que a manifestação do Samae para o Tribunal de Contas dizia que o órgão estava preocupado com impactos financeiros negativos com um possível aumento excessivo da tarifa, mas que para a Ação Popular a autarquia respondeu que o aditivo estava correto e sofria ações midiáticas por parte de parlamentares. “Em qual Samae a gente vai acreditar?”, perguntou Volpato. Vargas usou sua trajetória na Polícia Civil para tentar justificar, tropeçou nas palavras e também não respondeu diretamente à pergunta.
Em sua fala, Silmara Miguel (PSD) fez um questionamento onde apontava irregularidades em relação à prestação de serviço prevista em contrato comparada ao saldo positivo já apresentado pela BRK e, dessa forma, querendo entender qual seria a lógica que justificaria o aumento. Mais uma vez, Goetzinger tentou explicar, mas não convenceu ninguém.
Diego Nasato (Novo) perguntou qual seria a importância (e o objetivo) do Plano Municipal de Saneamento Básico e por que o município decidiu ir contra tal Plano ao assinar o quinto aditivo. Também expôs informações conflitantes envolvendo os próprios envolvidos e pediu o documento técnico que comprova a eficiência do sistema de fossa e filtro. Vargas basicamente disse que o Plano Municipal de Saneamento Básico está desatualizado, prometeu trazer estudos técnico-científicos (mas sem nenhuma previsão de data).
Marcelo Lanzarin (PP) evocou a atualização do Marco do Saneamento Básico de 2020 e levantou a possibilidade de o município captar financiamentos federais para reduzir seu próprio déficit contratual com a BRK. Vargas concordou.
Bruno Cunha (Cidadania) perguntou sobre a data em que uma auditoria mais profunda foi solicitada à administração pública. Goetzinger disse não ter os prazos em sua memória, mas garantiu – sem comprovação – que esse processo estava em encaminhamento.
O presidente da casa, Ito de Souza (PL), questionou a BRK sobre um hiato em que a empresa não implementa novas redes de esgotamento sanitário desde 2023, citando locais que carecem de tal serviço, entre eles a Rua Hermann Huscher, Santa Maria, Cohab Fidélis e Loteamento Libertadores, configurando quebra de contrato. O presidente também citou os buracos criados pela má qualidade do serviço da BRK em ruas recém-pavimentadas e tampas de bueiros encaixadas de forma desajeitada, causando ruídos à noite. Cleber disse não ter nenhum relato de sistemas que não funcionavam, dando a entender que a informação era nova ou imprecisa.
Enquanto isso, o líder de governo, Flavinho Linhares (PL), elogiou a AGIR, mas questionou o fato de a agência ter contratado uma empresa que já enfrentava suspeitas de irregularidade em sua contratação anterior. Como Paulo Costa não veio, essa questão não teve resposta.
Resultado
Adriano Pereira criticou o modelo de concessão atual e classificou a taxa prevista como abusiva. Ito relembrou que desde 2009 eram discutidas alternativas menos onerosas para resolver o problema de saneamento básico da cidade, cobrando uma reavaliação do acordo entre a BRK e o Samae. Gilson – o autor do requerimento na Comissão de Educação – mostrou indignação com as respostas evasivas dos convocados, afirmando que o representante da AGIR parecia mais estar defendendo a BRK do que os interesses da cidade. Nasato – autor do requerimento para criar uma CPI sobre o contrato de esgoto – definiu a audiência como constrangedora.
Piorando a situação, AGIR e BRK não apresentaram planilha que embasa o reajuste na tarifa de esgoto durante reunião da Comissão de Educação.
Sem a apresentação de informações técnicas detalhadas, especialmente em relação ao modelo econômico-financeiro do contrato de concessão, Gilson destacou que os parlamentares não obtiveram respostas à altura. Para ele, a oitiva terminou em frustração.
Opinião
Paulo Costa não veio. Ou ele despreza a Câmara Municipal de Blumenau (e seus milhares de eleitores), ou ele fugiu de algo que sabia não conseguir explicar. Independe de ter ou não outros compromissos. 15% de aumento numa tarifa pesará de forma devastadora em muitas famílias na cidade... mas os compromissos de Costa parecem mais prioritários para ele.
Desprezo com nossas demandas ou evasão indolente, o dano é o mesmo. O recado também.
André Domingos Goetzinger é um homem muito educado. Sua postura foi respeitosa e gentil em todos os momentos. Contudo, ele se portava muito mais como um advogado defendendo os interesses da BRK do que como um agente público lutando pelos interesses da população de uma cidade. E isso realmente causou uma impressão muito ruim.
Já Cleber Renato da Silva é representante dessa empresa desde a época da Foz do Brasil. Ele conhece todos os muitos pontos fracos da instituição questionável para a qual trabalha e, justamente por isso, aprendeu com o tempo a contornar o incontornável.
Alexandre de Vargas – atual presidente do Samae – é um homem com uma trajetória policial respeitável. Mas sua atual posição não o favorece, colocando-o na inefável função de discutir inutilmente contra a lógica. E a lógica é: todos os blumenauenses odeiam o trabalho de péssima qualidade da BRK e ninguém quer pagar esse aumento obsceno proposto por eles.
Contudo, é necessário voltar um pouco no tempo para botar tudo em perspectiva.
Seja bem-vindo a 2009
Com apenas 4,8% de cobertura de esgoto efetivamente implantada, Blumenau enfrentava um problema sério de saneamento básico. O Samae afirmava ter uma cobertura de 23,2%. Essa discrepância se devia a um convênio entre a prefeitura e o governo Lula para atender à região central da cidade, que não chegou a ser executado.
O então prefeito João Paulo Kleinübing lançou a Concorrência Pública nº 03-004/2009, visando à concessão dos serviços de esgotamento sanitário no município. O contrato previa um prazo de 35 anos (até 2044) e um valor estimado de R$ 1,89 bilhão, abrangendo desde a coleta até o tratamento e disposição final dos esgotos. Isso gerou muita crítica na época.
A Odebrecht venceu a licitação em 2010. As obras começaram em julho daquele ano, com a meta de alcançar 100% de esgoto tratado até 2017. Além disso, foi estabelecida uma parceria conhecida como Troca-PAC, na qual a Odebrecht se responsabilizou por executar uma obra inicialmente planejada em convênio com o governo federal, enquanto o Samae ficaria encarregado de implantar a rede de esgoto na Vila Itoupava.
Claro que o Samae não teve a capacidade de concluir tal obra dentro do prazo previsto (impactando negativamente a taxa de cobertura na cidade) e a Odebrecht não honrou a previsão de alcançar 65% de tratamento até 2012.
Hoje – 23 de maio de 2025 – Blumenau tem apenas 49% de esgoto tratado.
Com um aumento injustificável (até pela ausência de dados explicativos da própria empresa), o cidadão blumenauense sofreu um acréscimo de extorsivos 15,9% na tarifa de esgoto, além de uma prorrogação contratual que deixa a cidade refém de seus serviços impopulares até 2064 e estabelece que quase metade da população pague uma taxa de 70% do consumo de água para os caminhões limpa-fossa da BRK. Esse último ponto é ultrajante.
Não chega a ser ilegal (porque a empresa atua mediante uma concessão pública), mas a ausência de concorrência direta fere os princípios da livre concorrência e a cobrança automática na fatura pode configurar cobrança indevida ou abusiva.
A BRK afirma que até 2029 terá concluído a cobertura de esgoto de Blumenau em mais de 90%. E isso chega a ser matematicamente engraçado, porque – na velocidade com a qual trabalham – um cálculo básico mostra que só entregariam a obra completa em 2042. O que faz sentido para uma empresa que tem mentido reiteradas vezes desde 2010.
Relembrando a Odebrecht e a Operação Lava Jato
Em 2014, a Odebrecht – hoje Novonor – foi um dos pivôs do maior esquema de corrupção do planeta, desmantelado pela Operação Lava Jato. Pagamento sistemático de propina a políticos e partidos em troca de contratos públicos, cartel com outras empreiteiras para fraudar licitações e esquematização do pagamento de propinas foram alguns dos crimes.
O escândalo envolvia contratos bilionários com a Petrobras, governos federal, estaduais, prefeituras e o próprio presidente Lula: amigo do amigo do pai de Marcelo Odebrecht. Mais de 70 executivos da empresa fizeram delação premiada, que firmou acordo de leniência se comprometendo a devolver mais de R$ 8 bilhões aos cofres públicos.
Entre 2016 e 2017, vários municípios começaram a reavaliar concessões ou aditivos com empresas do grupo, temendo irregularidades ou pressão pública. Blumenau já era achacada pela agora Foz do Brasil (Odebrecht), com a meta contratual inicial já desonrada.
O então prefeito Napoleão Bernardes (PSD) – seja lá por qual razão – não aproveitou o momento para reavaliar a posição submissa, desvantajosa e passiva que a cidade tinha com aquela que pertencia, até então, à empresa mais corrupta do planeta. Políticos locais como o próprio Napoleão e o ex-senador Dalírio Beber (PSDB) também tinham que justificar denúncias de que estariam envolvidos nas planilhas e esquemas dessa grande corporação nefasta.
Surgiram suspeitas, críticas e debates políticos onde se acusava (sem provas) alguns vereadores blumenauenses de terem recebido dinheiro para facilitar a entrada da Odebrecht em Blumenau. Até hoje ninguém provou culpa ou inocência do fato.
Em 2017, a Odebrecht vendeu sua operação de saneamento para o fundo canadense Brookfield Infrastructure Partners, rebatizando seu nome para BRK e fazendo um esforço de marketing para tentar desvincular seu nome da desgastada Foz do Brasil (porém mantendo praticamente os mesmos funcionários-chave, a mesma baixa responsabilidade ética e o mesmo serviço deplorável executado por cifras muito acima do que valem).
Empresas como essa justificaram a criação de um moderador. Surgia assim a AGIR.
A AGIR entra na história
Criada em 16 de abril de 2010, a AGIR representa 14 municípios (entre eles Blumenau, Apiúna, Ascurra, Benedito Novo, Botuverá, Brusque, Doutor Pedrinho, Gaspar, Guabiruba, Indaial, Pomerode, Rio dos Cedros e Rodeio). Já teve cinco presidentes – nenhum blumenauense (apesar de ser sediada aqui) – e trata-se de um consórcio público intermunicipal, com o objetivo de garantir a qualidade, a eficiência e a modicidade tarifária dos serviços públicos delegados a empresas concessionárias.
Mas é o que ela faz? Não necessariamente. A AGIR tem enfrentado críticas quanto à sua eficácia, especialmente no que diz respeito à transparência e à defesa dos interesses dos usuários. Basta lembrar que este ano a agência queria que a tarifa do transporte coletivo de Blumenau subisse a ofensivos R$ 8,98 – se tornando a mais cara do Brasil.
A agência – que é mantida por dinheiro público advindo dos impostos municipais das cidades consorciadas – tem agido mais como advogado de defesa mediador dos interesses de empresas cujos escrúpulos a sociedade questiona do que como defensora dos direitos daqueles que pagam caro pela sua existência.
A AGIR – refletida pelo desrespeito da ausência de Paulo Costa – é um desperdício de recursos financeiros que nos últimos anos tem parecido beneficiar apenas aqueles a quem deveria fiscalizar. Na melhor das hipóteses, uma entidade absolutamente inútil.
Tony Montana ficaria feliz por ontem
Um plenário com vários vereadores. A imprensa olhando ativamente tudo que acontecia. Os nervos à flor da pele. Três convocados a depor: um representante de uma empresa questionável, um fiscal que age como advogado da dita empresa e um mediador entre os interesses da empresa e o dinheiro das vítimas.
Muitas perguntas. Poucas respostas. Objetividade nenhuma. Nenhum documento com dados verificáveis que justificassem o vilipêndio ao dinheiro das vítimas. Falas rebuscadas, cheias de tecnicidade e siglas que desfocavam o objeto da questão. Perguntas feitas em cima de outras perguntas de forma atabalhoada, que justificavam um “não me lembro de tudo que foi perguntado então só vou responder o que me interessa”. Gagueira. Suspiros. Evasão.
No fim do dia, nada mudou. Até o fim do ano, nada mudará.
A BRK conseguiu o aumento que queria. Além disso... também conseguiu impor uma insólita venda casada de limpa-fossa e vai permanecer onde está até o ano de 2384 (caso ainda ache interessante o dinheiro fácil daqui). E, se continuar assim, quem sabe entreguem 70% da rede de esgoto concluída nos próximos duzentos anos?
Eles ganharam muito dinheiro e ganharão ainda mais. Os funcionários da AGIR estão sendo bem remunerados para (na melhor das hipóteses) não entregar absolutamente nada para a comunidade. Os vereadores voltaram para casa frustrados com o que ocorreu. E o cidadão – esse eterno idiota que trabalha para nunca poder usufruir do júbilo do seu próprio suor – continua pagando para ser achacado, desprezado, debochado e mal defendido.
Qualquer mafioso de filme mexicano de quinta categoria lançado em Technicolor nos anos 50 bateria palmas para o que ocorreu ontem. Don Vito Corleone não... ele teria pena dos coitados que trabalham para serem feitos de palhaços.
Às vezes, até um mafioso pode ter mais decência...