Para agradar o eleitorado, parlamentares aprovam pautas-bomba
Foto: Marcos OliveirSunday, 15 July 2018
No Congresso, mesmo partidos aliados do presidente Michel Temer contrariam orientação do Planalto e votam a favor de medidas que aumentam gastos públicos, sem levar em conta impacto das decisões no Orçamento.
Neste ano, a preocupação dos parlamentares cujos mandatos acabam em dezembro é uma só: reeleição. Para conquistar o objetivo, eles estão dispostos a aprovar matérias que agradam parte do eleitorado, mas colocam as contas públicas ainda mais no vermelho. As chamadas “pautas-bomba”, que incluem isenções a diversos setores da economia e garantias de reajustes acima do que os cofres públicos conseguem suportar, custarão até R$ 100 bilhões nos próximos anos.
O consultor político e professor da Universidade Católica de Brasília Creomar Souza afirma que os parlamentares não se importam com o aumento de gastos públicos por que não têm nada a perder. De acordo com Souza, eles não pensam duas vezes antes de firmar “relações de promiscuidade com setores de empresários e servidores, que resultarão em uma conta impagável”. Na terça-feira, por exemplo, para agradar as indústrias de refrigerante da Zona Franca de Manaus, o Senado revogou um decreto presidencial que aumentava a arrecadação do setor. A medida custará R$ 1,78 bilhão por ano, caso passe também pela Câmara dos Deputados.
A menos de três meses do primeiro turno das eleições, nem os aliados do presidente Michel Temer no Congresso demonstram constrangimento ao aprovar matérias que contrariam a orientação do Palácio do Planalto — e que, comprovadamente, terão altos impactos fiscais e orçamentários. “A lógica do parlamentar é que, aprovando mais gastos e isenções, ele ganha eleitor e não perde nada, porque não é ele que paga a conta. Se o governo não cumprir meta fiscal ou regra de ouro, o problema não é dele”, explicou o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Bancadas infiéis
Outro sinal claro de pouca preocupação com o gasto público foi dado durante a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019, na última quarta-feira, em sessão do Congresso.
Em alguns casos, 15 minutos de pressão no plenário foram suficientes para que bancadas aliadas do governo desistissem de apoiar a proibição de reajustes salariais aos servidores públicos no ano que vem, que constava da proposta do Executivo.
Esse foi o tempo que o DEM, por exemplo, levou para mudar a orientação aos deputados. O PR liberou a bancada para votar como quisesse 20 minutos após ter orientado contra o destaque que liberaria o aumento de gastos. O PP e o MDB, do presidente Michel Temer, sugeriram inicialmente o voto a favor da proibição do aumento dos salários, mas voltaram atrás. “Os deputados estão pedindo. E a liderança refaz o que a bancada quer: muda a orientação”, justificou o deputado Arthur Lira (PP-AL), líder da bancada. Segundo ele, foi uma forma de “ajudar no quórum” para “se livrar logo dessa votação”. Até o PSDB, que sempre defendeu o ajuste fiscal, liberou os parlamentares da legenda.
Outras pautas-bomba foram aprovadas facilmente nas últimas semanas, inclusive, pelas duas Casas, como o perdão de dívidas tributárias de produtores rurais, que custará R$ 13 bilhões ainda em 2018. A situação pode piorar caso outros benefícios fiscais sejam levados adiante em agosto, após o recesso, como a proposta de compensar os estados pela desoneração das exportações do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), medida que tem o potencial de retirar R$ 39 bilhões por ano dos cofres públicos.
Por não ter efeitos positivos comprovados, esse tipo de política é considerada eleitoreira por especialistas, além de desrespeitar recomendações do Tribunal de Contas da União (TCU), que têm constantemente alertado para o prejuízo da renúncia de receitas. Isenções e desonerações impediram o governo de arrecadar R$ 354,7 bilhões em 2017, segundo a Corte. Os pré-candidatos à Presidência da República, que deveriam se preocupar com os próximos orçamentos, não se manifestam, mesmo sabendo que, com a faixa presidencial, um deles assumirá a responsabilidade de colocar a casa em ordem. Para os presidenciáveis, a lógica é diferente da dos parlamentares: opor-se às pautas é uma atitude impopular, mas apoiá-las significaria colocar a corda no próprio pescoço. “Na dúvida, se mantêm em silêncio”, explicou Praça.