Bolsonaro: o homem que, sozinho, venceu o Sistema

Bolsonaro: o homem que, sozinho, venceu o Sistema
Foto: Rick Latorre

Sunday, 28 October 2018

Entenda como surgiu e o que gerou o fenômeno que transformou um deputado pouco prestigiado no candidato a presidente mais popular do Brasil

Ontem 57,7 milhões de brasileiros foram às urnas e escolheram o capitão da reserva Jair Messias Bolsonaro como o novo presidente do país. Alguns comemoraram. Outros sofreram. Mas essa, que foi a eleição mais atípica da nossa história, mostrou muito mais do que o desejo da maioria das pessoas. Mostrou que o sistema não está mais se mantendo.

Mas o que fez com que o político que recebeu apenas 120 mil votos como candidato a deputado federal pelo Rio em 2010 se tornasse o maior fenômeno do país?

Ele entrou para a vida pública em 1991 como representante dos militares em pleno Brasil pós-ditadura. Isso o relegou às sombras, sem expressão ou apoio dos colegas parlamentares. Era um estigma. Com embasamento teórico da caserna, ele ficou no baixo clero, onde era constantemente provocado por outros com a mesma relevância e sempre respondeu com rapidez de raciocínio, mas sem nenhum tipo de delicadeza.

Contudo sua história mudaria por causa de um crime: em 1° de novembro de 2003 o jovem casal Felipe Caffe e Liana Friedenbach foram acampar quando foram seqüestrados por dois criminosos, entre eles um apelidado de Champinha e outro de Pernambuco. Os dois meliantes, que eram menores de idade, estupraram a menina por quatro dias, a torturaram, degolaram e ainda por cima a violentaram enquanto estava morta. Chapinha foi preso, mas a Justiça o internou na Fundação Casa, de onde era transferido reiteradas vezes por sofrer ameaças de outros menores infratores que abominavam o monstro que ele é. Foi quando Bolsonaro apareceu defendendo a redução da maioridade penal. Então a deputada, também de baixo clero, Maria do Rosário, saiu em defesa do criminoso dizendo que era “apenas uma criança”. Ambos discutiram numa das cenas mais colocadas fora de contexto nessa eleição.

Depois, em 2005, já com certa visibilidade, ele voltou a aparecer por conta do Referendo do Desarmamento, que foi rejeitado pela maioria dos brasileiros e ainda assim ignorado pelo governo. Foi nessa época que a imensa maioria do país soube de seus projetos (nunca aprovados) como, por exemplo, a castração química e voluntária de estupradores.

Em 2011 combateu um material didático que seria distribuído nas escolas com o intuito de combater a homofobia, apelidando-o de “kit gay”. Discutiu com o deputado também de baixo clero Jean Wyllys, ex-BBB, e começou chamar ainda mais atenção. A mídia gostava dele por render, com suas respostas sem papas na língua, pontos de audiência. Foi a programas de rádio como o Pânico, de televisão como a Luciana Gimenez e de Youtube como do Nando Moura.

Em 2014, durante a crise no presídio de Pedrinhas (MA), Bolsonaro cativou de vez um número cada vez maior de brasileiros cansados da impunidade dizendo que as péssimas condições do presídio eram boas porque se o indivíduo não matasse, estuprasse ou roubasse não iria para la. Foi nessa época que começaram as manifestações de pessoas que o queriam presidente o ele ganhou o apelido ‘mito’.

Com essa popularidade e mostrando que tem visão, ele apostou fortemente nas redes sociais e se tornou, de acordo com o instituto FSB Pesquisa, o parlamentar mais influente na internet em 2017.

A classe média, cansada de pagar pelas contas dos outros e ter negados pequenos privilégios, se identificou com o político que criticava criminosos acolhidos pelos Direitos Humanos, afirmava que as ditas minorias queriam mais direitos do que os outros ao invés de igualdade e que não estava envolvido em nenhum tipo de negociata ou denúncia de corrupção. Qualificado ou não, ele se tornou uma espécie de personificação de um salvador da pátria.

Ao lançar sua candidatura, em agosto desse ano, Bolsonaro declarou aliança com apenas um partido: o PRTB de Levy Fidelix. Geralmente partidos grande, como o PSDB ou o PT, fazem alianças com diversos partidos para ter mais tempo de televisão. Em troca acabam tendo que negociar cargos, se eleitos. Mas Bolsonaro não se importou com a televisão.

Foi para a internet acompanhado de um séquito de seguidores, nem sempre ponderados ou racionais, inicialmente. Expôs suas opiniões, falou o que quis, soltou farpas em debates e metralhou os apresentadores do Jornal Nacional ao relembrar que William Bonner tinha acabado de sofrer um divórcio, forçando Renata Vasconcellos a mentir dizendo que ganhava o mesmo salário que o colega de bancada (quando, na verdade, isso seria impossível, uma vez que o cargo dele é o de editor-chefe, com R$ 800 mil mensais, e o dela é de editora executiva, com cerca de R$ 200 mil por mês) e lembrando a hipocrisia da Rede Globo ao militar pelos direitos trabalhistas enquanto contrata profissionais que são Pessoas Jurídicas para não precisara pagar férias, 13° e outros direitos.

Sua popularidade subia. A internet fervilhava com as suas respostas ácidas contra baluartes antes intocáveis do Sistema, como a própria Globo, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o PT.

Com medo real dele, partidos de esquerda começaram a espalhar uma campanha de terror para as pessoas mais sensíveis ou menos esclarecidas, Pessoas que passaram a ter um medo real de que ele ganhasse. A campanha da oposição chegou a tal nível que pessoas se feriam para acusar apoiadores de Bolsonaro, como foi o famoso caso da moça que fez uma suástica em si mesma.

Personalidades como a youtuber Kéfera fizeram vídeos desesperados comparando Bolsonaro a Hitler (prática que a esquerda faz desde que Lula concorreu a Presidência com Serra). Geraldo Azevedo mentiu acusando Mourão, vice de Bolsonaro, de tê-lo torturado e, para tentar virar o jogo, um PT desesperado tentou acusar Bolsonaro de espalhar as fakenews que o próprio PT espalhava. Isso, aliado à empáfia de o Partido dos Trabalhadores insistir em permitir que o Lula mandasse nas decisões mesmo estando preso, aumentou a antipatia popular. O sentimento, para muitos, não foi “Bolsomito”, mas sim “fora PT”.

No segundo turno Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) apoiaram Haddad, assim como o terrorista Guilherme Boulos (PSOL). Alckmin, Amoêdo, Álvaro Dias e Henrique Meirelles não apoiaram ninguém. Apenas o cabo Daciolo apoiou Bolsonaro. E ainda assim ele venceu,

Alguns explicam o fenômeno Bolsonaro justificando seu discurso ufanista como algo que reacendeu o nacionalismo brasileiro. Outros dizem que ele representou os ideias de alguém que não está fazendo o jogo da dita ‘velha política’. Também se usa sua suposta honestidade e ausência em escândalos de corrupção. Mas a verdade é que o povo sempre amou a parábola de David contra Golias. O pequeno que vence o gigante. Então o íntegro e desprestigiado deputado de baixo clero lutando sozinho contra um sistema corrompido até seus mais básicos alicerces cativou o povo. As pessoas se identificaram. Compraram a idéia.

O PT investiu R$ 19,8 milhões na campanha de Haddad, contra R$ 1,7 milhão do PSL. Os petistas fizeram comícios, angariaram apoio de artistas famosos e expuseram seu candidato em todas as oportunidades possíveis (até, ilegalmente, em missas). Já Bolsonaro, após a facada que recebeu em Juiz de Fora (MG) sequer foi aos debates do segundo turno.

Mas como um partido com tantos apoiadores, com uma coligação tão grande, com uma campanha milionária e que soube aproveitar todas as chances institucionais não conseguiu ganhar de um candidato que sequer saiu do hospital durante metade da campanha? Simples: descrença.

Jair Messias Bolsonaro não venceu o PT. Tampouco venceu as eleições. Jair Messias Bolsonaro venceu o Sistema. O Sistema desesperado que forçou o pronunciamento de juízes do Supremo Tribunal, que fez jornais de prestígio com a Folha de S. Paulo publicarem mentiras sem nenhuma comprovação e emissoras de televisão a darem mais minutos a um do que ao outro.

Há muitos que temem um golpe militar. Esses que apregoam a democracia, mas desfazem amizade com quem pensa diferente. Aqueles que juram lealdade ao Brasil, mas agora torcem para que dê tudo errado. Outros tantos que falam de amor e agora desejam o mal de quem pensa diferente. Mas o golpe não foi militar e nem no povo. Foi no Sistema.

O candidato politicamente mais incorreto de todos ganhou porque as pessoas não suportam mais a patrulha moral alheia. O homem que não defende regalias para ninguém venceu os grupos que representam ‘minorias’ que são, na verdade, maiorias. Bolsonaro virou as costas para os maiores barões da imprensa, como o Collor antes dele, mas venceu.

É uma nova era. Não é possível ainda dizer se será boa ou não, mas certamente não haverá campos de concentração e a velha mídia vai ter que penar para se manter com sua relevância. A prova disso é que outros candidatos vitoriosos, como o atual governador de Santa Catarina, Carlos Moisés, também não foram a debates. Como se dissessem – “ninguém mais precisa da televisão” – e acertassem. Esse golpe no monopólio da informação será sentido por muito tempo.

Jair Bolsonaro ainda nem assumiu o cargo, mas já revolucionou o Sistema. Resta torcer para que o remédio seja realmente melhor do que a doença.


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Ricardo Latorre

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