Por que revistas e jornais têm mentido tanto?

Por que revistas e jornais têm mentido tanto?
Foto: Cachorrinho muito bonitinho usando o banheiro.

Monday, 08 July 2019

O ponto vai muito além do proselitismo político e é muito mais primitivo do que ideologia: é financeiro.

Já não é de hoje que a grande imprensa tradicional – aquela composta por jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão – vem perdendo credibilidade por conta de matérias, muitas vezes, de procedência duvidosa e sem a devida checagem de fontes.

O último escândalo – os supostos vazamentos publicados pelo site Intercept com interceptações ilegais atribuídas ao ministro Sérgio Moro sem nenhuma prova pericíavel e que, ainda assim, ganharam ares de verdade absoluta por muitas revistas e jornais colocaram ainda mais em descrédito instituições que já foram baluartes da credibilidade.

Jornais como a Folha de S. Paulo passam a se portar como tabloides sensacionalistas e revistas como a Veja ganham roupagem de periódico de fofoca barata e propaganda anti-governista.

Esses veículos de comunicação – de importância histórica inquestionável que estiveram da queda do Muro de Berlim ao atentado contra as twin towers do World Trade Center em 11 de Setembro de 2001 – parecem ter virado as costas para o seu próprio passado de conduta exemplar para se tornarem esboços panfletários quase cômicos do que deveriam ser.

Então muitas pessoas – governistas, conservadores, monarquistas e todo um amplo espectro da Direita – apontam para esses veículos e dizem que são “comunistas”, “esquerdistas”, ou “progressistas”, mas a verdade é que não são: eles são empresas alquebradas desesperadas por dinheiro vendo suas vendas diminuindo cada vez mais.

A mesma Veja que mais de uma década atrás colocava o Lula num crucifixo na capa tirando sarro dele (e com isso ganhou o apelido de 'a máquina de destruir reputações), hoje faz montagens com Sérgio Moro chamando-o de parcial. A mesma Folha de S. Paulo que tinha nos anos 90 slogans como “o jornal que mais se compra e que nunca se vende” ou “alguém com essa honestidade só podia trabalhar na Folha” hoje se torna meretriz de sites bancados por pessoas com interesses suspeitos, como o Intercept. Não por ideologia, mas por dinheiro.

A internet já tem um nome para isso: clickbait.

Quando um site, canal do Youtube ou rede social exagera em uma manchete para chamar atenção (ou coloca uma imagem apelativa que nada tem a ver com o conteúdo) faz-se um clickbait. Os jornalistas antigos já conheciam essa prática. Quem não lembra do fogaréu que atingiu uma agropecuária carioca e foi noticiado como “incêndio mata flora fluminense”?

Os jornais O Globo, Folha de S. Paulo, Super Notícias, Estadão, Zero Hora, O Estado de Minas, Correio Brasiliense, Valor Econômico, A Tarde e O Povo registraram redução de 35,9 mil exemplares em 2018.

De acordo com o Instituto Verificador de Comunicação (IVC), a revista Veja perdeu 401 mil exemplares no mesmo ano. Já as assinaturas digitais aumentaram no caso d’O Globo, mas despencaram no caso da Veja, deixando bem claro que o leitor não tolera mais clickbait, seja ele ideológico ou não. Esse número vem despencando desde 2012 e só piora.

Mas não pára por aí: de acordo com a Agência Nacional do Cinema (Ancine) a participação da TV aberta caiu de 63,7% para 41,5% entre 2007 e 2014, antes de existirem serviços populares de streaming como Netflix, cuja renda (R$ 1,1 bi) já ultrapassava o SBT em 2016.

Em 2017 a Globo, que é a líder absoluta de audiência televisiva, teve 36,7% de share no PNT, diminuindo para 35,9% em 2018 e entrando 2019 com 34%. Uma retração de três anos consecutivos demonstra que o jornalista William Waack tinha razão quando disse que a emissora deixou de se importar com a credibilidade para visar apenas a popularidade.

Com um público cada vez menor, a chamada ‘Vênus Platinada’ tem apostado no popularesco como agendas progressistas, roteiros que pregam a separação das pessoas e programas de péssima qualidade. A Record, mesmo crescendo um pouco, também tem pecado em sua programação exibindo novelas extremamente nichadas e programas reprisados.

Agravando ainda mais a situação, as eleições do ano passado revolucionaram a forma de se comunicar. A internet, praticamente sozinha (enquanto meio de comunicação) elegeu um presidente da República. Um presidente que sabe usar suas redes sociais para cativar pessoas e noticiar as ações de seu governo. Algo que a oposição, incapaz de fazer sem a obtenção de meios questionáveis como compra de bots ou pagamento de propina a veículos de comunicação, simplesmente não consegue reproduzir.

A situação tornou-se tão dantesca que a maioria das pessoas confia mais em informações não checadas em grupos de WhatsApp do que nas empresas que noticiaram algumas das mais importantes façanhas da raça humana. E por que? Porque essas empresas também não checam mais. Então entre confiar num jornalista desconhecido que vive em Brasília (e já publicou inverdades sem se retratar outras vezes) ou nas informações de uma tia que mora em Jundiaí, muitas pessoas escolhem a tia. É a reação simples a uma ação que não pode mais parar.

Soma-se a isso formadores de opinião com narrativas muito bem fundamentadas no Youtube, perfis que ridicularizam a Esquerda no Instagram e políticos, como a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), que estão sabendo divulgar suas ações com mais profissionalismo que muita redação de jornal centenário. Em um mundo onde todos têm voz e mentiras podem ser descobertas em minutos, a imprensa que não se reciclar vai acabar morrendo.

Casos como os dos jornalistas mentirosos Janet Cooke, Jayson Blair, Michael Finkel e Stephen Glass podem ter levado muito tempo para que fossem desmascarados no passado, mas hoje é diferente. Por exemplo: no mesmo dia que em a Rede Globo mentiu sobre o documentário ‘1964: O Brasil Entre Armas e Livros’ do Brasil Paralelo foi desmascarada, tendo de ceder, inclusive, direito de resposta. Não há mais mentira ou narrativa falaciosa que se sustente quando a maioria das informações está na distância de um clique.

Infelizmente, os dois casos mais emblemáticos do país – a Folha e a Veja – não parecem ter bons prognósticos. Enquanto a Folha usa a estratégia de radicalizar cada vez que despenca as vendas (sem perceber que é isso que a está derrubando) – a Veja, do Grupo Abril (gigante editorial brasileiro falido e vendido por simbólicos R$ 100 mil) passa a ser transferido para Fábio Carvalho sob tutela do BTG Pactual, banco fundado pelo empresário André Esteves, preso na Lava-Jato por envolvimento com Nestor Cerveró. Neste caso é de se esperar que as falsas notícias continuem sendo produzidas e que, com isso, as vendas continuem caindo.

Linha editorial nunca foi o problema. O problema é fingir isenção, publicar mentiras das quais jamais se retratará e achar que os leitores são tolos o bastante para continuar gastando dinheiro com esse tipo de frivolidade.

E, convenhamos, jornais só têm venda ainda porque custaria muito caro forrar um chão de gaiola com um tablet.


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Ricardo Latorre

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