Maré vira na guerra à medida que a Rússia avança
Foto: DivulgaçãoTuesday, 28 June 2022
Forças russas estão em sua melhor fase desde o início da invasão da Ucrânia, segundo analista.
As forças russas estão talvez em sua melhor fase desde o início da invasão da Ucrânia, há quatro meses.
Eles eliminaram a maior parte das defesas ucranianas na região de Luhansk, consolidaram o controle de uma faixa de território no sul, melhoraram sua logística e estrutura de comando, e restringiram a efetividade dos ataques de drones da Ucrânia.
Na última semana, os russos foram recompensados por seus bombardeios intensos nas regiões em Luhansk ainda comandadas por ucranianos, que finalmente abrirão mão de Severodonetsk e perderam território ao sul de Lysychansk.
O líder da autodeclarada República Popular de Luhansk (RPL), Leonid Pasechnik, previu na última sexta-feira (24) que as forças russas iriam cercar completamente Lysychansk em um prazo de dois a três dias. Até o momento, não o fizeram, mas a cidade está em perigo iminente.
O exército russo também elevou os ataques na região de Donetsk, se aproximando do cinturão de cidades industriais na área — que se estende do sul de Sloviansk, através de Kramatorsk, até Kostiantynivka.
Em Lysychansk, e em muitas das cidades espalhadas pelos meandros das linhas de frente que passam por cinco regiões, os ucranianos podem enfrentar novamente o que aconteceu em Severodonetsk, onde foram bombardeados até a retirada. Não havia mais o que pudesse ser defendido.
O dilema imediato do exército ucraniano é se permanece compromissado em defender Lysychansk, sob o risco de perder soldados e armas no caso de a cidade ser cercada, ou se a liderança política da Ucrânia ordenará uma retirada em direção a novas linhas defensivas.
Se for o caso, as unidades dentro do território mantido pela Ucrânia conseguirão recuar sem serem dizimadas? Grandes fatias da estrada entre Lysychansk e Bakhmut estão sucateadas com detritos, e unidades russas estão chegando perto de Bakhmut.
Aparentemente, os russos não estão fazendo muito progresso em Izium, ao norte em direção a Sloviansk, apesar dos esforços constantes para atravessar as linhas ucranianas. Mesmo assim, os oficiais ucranianos alertaram no domingo (26) sobre um “acúmulo” de soldados russos ao norte de Sloviansk. O exército russo pode mobilizar rapidamente alguns grupos táticos de batalhões do outro lado da fronteira.
Alguns blogueiros militares russos não estão se deixando levar pelo otimismo. Yuri Kotyenok, por exemplo, acredita que as forças russas não têm mão de obra o suficiente para cercar as cidades fortificadas de Slovyansk e Kramatorsk.
A longo prazo, a melhor esperança dos ucranianos é de trazer mais armas do Ocidente capazes de destruir a artilharia russa, sistemas de mísseis e postos de comando longe das linhas de frente, para diminuir gradualmente o déficit no poder de fogo.
Mas armas como o sistema de foguetes HIMARS, que tem um alcance de 70 quilômetros na configuração fornecida à Ucrânia, exigem várias semanas de treinamento. E em Donbass, várias semanas é muito tempo, dada a atual pressão sobre as forças ucranianas.
Essa pressão é ainda maior porque muitas das unidades implantadas na região estão entre as mais experientes da Ucrânia. Elas foram desgastados pela pura intensidade do bombardeio russo e não são facilmente substituídas.
E os militares ucranianos já perderam em combate algumas das armas levadas para a frente. O Ministério da Defesa da Rússia afirmou na semana passada que os ataques russos já haviam eliminado alguns dos obuses M777 fornecidos pelos EUA.
A ofensiva russa também aprendeu com os erros cometidos durante a campanha inicial e abortada em direção a Kiev.
As defesas aéreas, principalmente o S-300, foram implantadas para fornecer cobertura extensa em vez de local, tornando os drones de ataque ucranianos menos eficazes. Curiosamente, parece que menos vídeos foram postados recentemente nas mídias sociais mostrando aviões de combate ucranianos em ação.
Rússia nomeia novos comandantes
A hierarquia russa também foi reorganizada, com novos comandantes para as forças do sul e do centro comprometidos com a Ucrânia sob a liderança geral do vice-ministro da Defesa, Gennady Zhidko.
O Instituto para o Estudo da Guerra disse que “o alto comando russo está reorganizando e reestruturando o comando militar para organizar melhor as operações na Ucrânia”.
Talvez não seja por acaso que a primeira visita relatada do ministro da Defesa russo Sergei Shoigu e de comandantes seniores às forças envolvidas na “operação militar especial” ocorreu quando a maré parecia fluir a favor da Rússia. A vitória tem mil pais, mas a derrota é órfã.
Rob Lee, analista do exército russo no King’s College London, observou que Zhidko se sentou ao lado de Shoigu em reuniões durante sua visita. Lee lembrou que a Rússia aparentemente “não tinha um comandante geral na fase inicial (em março), violando o princípio da unidade de comando”.
A grande incógnita é se o sucesso russo em aumentar as defesas ucranianas em Donetsk pode encorajar uma maior expansão de seus objetivos de guerra além da operação militar especial – talvez um esforço para sustentar o impulso até o rio Dnipro, que essencialmente divide a Ucrânia em dois.
Esse é o pior cenário para os ucranianos e, por enquanto, continua sendo uma possibilidade distante, e não um risco iminente. As forças ucranianas ainda estão defendendo cerca de 12.000 quilômetros quadrados apenas de Donetsk.
Apesar dos reveses ucranianos nas últimas semanas, ainda há muitas evidências de que os blindados russos também estão sofrendo uma alta taxa de desgaste. Autoridades ocidentais acreditam que alguns grupos táticos do batalhão foram reconstituídos.
E pode haver uma fresta de esperança para a Ucrânia em seus reveses no campo de batalha: eles defendem um pipeline acelerado de armas do Ocidente no momento em que os líderes do G7 se encontram.
Um dos apoiadores mais comprometidos do presidente Volodymyr Zelensky, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson, está ciente do risco de “fadiga da Ucrânia”, já que o campo de batalha parece virar a favor da Rússia.
“As primeiras semanas e meses da resistência ucraniana foram caracterizadas por uma unidade global avassaladora e uma enorme onda de apoio ao povo ucraniano”, disse ele quando o G7 começou na Alemanha.
O presidente dos EUA, Joe Biden, fez um apelo semelhante. “Temos que ficar juntos. Putin conta desde o início que de alguma forma a Otan e o G7 se dividiriam, mas não fizemos e não vamos fazer isso”, disse ele.
Não há — por enquanto — nenhum sinal de que qualquer um dos lados vai piscar, até porque há muito em jogo.
Hal Brands, escrevendo na Foreign Affairs, disse que o conflito “tanto destacou quanto aprofundou a clivagem global fundamental hoje — o confronto entre democracias avançadas que estão comprometidas com a ordem internacional existente e as autocracias eurasianas que tentam derrubá-la”.
Mas para Putin, essa guerra de escolha é uma parcela (grande) de uma luta existencial contra a hegemonia dos EUA.
O Instituto para o Estudo da Guerra concluiu que o Kremlin “pretende conduzir um conflito prolongado na Ucrânia e está buscando avançar nos esforços de mobilização para apoiar objetivos militares e políticos de longo prazo nas áreas ocupadas da Ucrânia”.