A cidade de Belém (PA) se transforma em um imenso rio de gente quando chega o mês de outubro. Nas ruas, o cheiro do patchouli se mistura ao som das ladainhas, ao batuque dos tambores e ao colorido das fitas, bandeirinhas e flores que anunciam a chegada da maior procissão católica do mundo. É o Círio de Nazaré, expressão de fé que ultrapassa gerações e fronteiras – e que, a cada ano, revela também a força criativa e econômica da cultura amazônica.

Em 2025, o Governo do Brasil, por meio do Ministério do Turismo, destinou R$ 2 milhões para apoiar a realização da festividade. Trata-se do maior investimento federal da história do Círio, voltado à infraestrutura e à organização do evento. O aporte reforça o compromisso do órgão com o fortalecimento do turismo religioso, reconhecido no Plano Nacional de Turismo (PNT) 2024-2027 como um dos segmentos mais estratégicos do setor.

Mais que um ato de fé, o Círio de Nazaré é, também, um fenômeno cultural e econômico. Em 2024, o evento reuniu 2 milhões de fiéis, recebeu 89 mil turistas e movimentou R$ 189 milhões na economia paraense. Neste ano, a expectativa é ultrapassar a marca de 100 mil visitantes, com um impacto estimado de R$ 210 milhões – números que refletem o poder do turismo de fé como motor de desenvolvimento e orgulho para o Pará e o Brasil.

No próximo domingo (12.10), a partir das 10h, a celebração do Círio de Nazaré na capital paraense será transmitida ao vivo pelo YouTube do Ministério do Turismo, a TV Brasil Internacional e o Canal Gov.

Cultura

Nas ruas de Belém, durante o Círio de Nazaré, a devoção também se mistura à arte, e a fé ganha cores, sons e movimento no popular Arrastão do Círio. A realização é do Instituto Arraial do Pavulagem, criado em 1987 e que se consolidou como uma das maiores referências da cultura amazônica, reunindo artistas, mestres populares e milhares de brincantes em cortejos que arrastam multidões.

Reconhecido como Manifestação da Cultura Nacional em 2024, o Arraial do Pavulagem tem como pilares a inclusão, a sustentabilidade, a cidadania, a solidariedade e o respeito à diversidade. Em suas brincadeiras de rua, pernas de pau, chapéus de palha, estandartes coloridos e tambores conduzem o público ao ritmo do carimbó, da marujada e da guitarrada, celebrando a Amazônia em forma de música, dança e alegria.

“O Círio é o coração da nossa identidade paraense. Quando o governo investe na cultura e na economia criativa, fortalece a alma do Pará e garante que nossas manifestações continuem encantando o Brasil e o mundo”, aponta Júnior Soares, músico, compositor, produtor cultural e cofundador do Arraial do Pavulagem.

Auto do Círio

Outro espetáculo que emociona o público é o Auto do Círio, dirigido pela atriz e professora Inês Ribeiro, da Universidade Federal do Pará (UFPA). Encenado às vésperas da grande procissão, o evento transforma as ruas do centro histórico de Belém em um imenso palco, onde fé e arte caminham junhos. Com atores, músicos e bailarinos, a apresentação mistura teatro, dança e música popular, retratando o encontro entre o sagrado e o popular e fazendo ecoar nas janelas e calçadas o espírito devoto que toma conta da cidade.

“É uma manifestação que fortalece a identidade cultural do Pará, forma novas gerações de artistas e cria um espaço de encontro entre fé, arte e consciência social. O Auto não é só espetáculo: é partilha, formação e celebração coletiva”, explica a diretora Inês Ribeiro, que há anos conduz o projeto reconhecido por sua força simbólica e envolvimento comunitário.

Em 2025, o Auto ganhou um novo marco: foi reconhecido como Patrimônio Cultural e Imaterial do Pará, o que assegura sua preservação e continuidade como um bem que pertence ao povo. O cortejo deste ano traz o tema “Nossa Senhora de Nazaré, iluminai as lutas dos povos da Amazônia”. “Vamos refletir sobre fé, crise climática, povos da floresta e culturas da periferia. Nossa expectativa é mobilizar milhares de pessoas em um cortejo de arte e devoção que ilumine, pela fé, as lutas e esperanças da Amazônia”, antecipa Inês Ribeiro.

Miriti

Entre os ícones mais delicados da cultura paraense estão os brinquedos de miriti, confeccionados pelos artesãos da cidade de Abaetetuba, às margens do rio Maratauíra. Leves e coloridos, feitos da madeira do miritizeiro – uma palmeira típica das várzeas – eles retratam o cotidiano ribeirinho. E, durante o Círio, tomam conta das feiras e enfeitam as calçadas, encantando quem chega pela primeira vez ao município.

Cada peça carrega meses de dedicação e é resultado de um ofício transmitido por gerações. Mais que lembranças, os brinquedos são poemas esculpidos na madeira, representando a fé que flutua sobre os rios da Amazônia e o talento de um povo que transforma arte em sustento e devoção.

Suporte

O apoio do Ministério do Turismo ao Círio soma-se a um conjunto de iniciativas para fortalecer o segmento religioso no país. Entre elas, a inscrição de prestadores de serviços turísticos no Cadastur, que promove a formalização na área, e a oferta de financiamentos a empreendedores privados por meio do Fundo Geral de Turismo (Novo Fungetur), que proporciona a obtenção de capital de giro, a aquisição de equipamentos e a realização de obras.